Wazamonogatari ~Brazilian Portuguese~/Bom Apetite, Acerola 008

From Baka-Tsuki
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008[edit]

De uma maneira ou de outra, parece que eu morri novamente.

Mesmo na minha longa vida vampírica — e, claro, na minha vida dietética — eu nunca fui morto duas vezes seguidas em um período de tempo tão curto, e pelo mesmo oponente também. Apesar de que, de acordo com o oponente em questão, eu simplesmente morri por meu próprio acordo; não é como se a própria Princesa Acerola tivesse feito alguma coisa.

A primeira coisa que eu sentir após voltar à vida foi a batida do meu coração que continuava batendo, que eu estava segurando em minha mão direita — parece que desta vez eu arranquei o meu coração.

O coração dentro do meu peito já parecia ter sido restaurado.

Hmph.

Acho que fiquei acostumado a isso — a olhar o meu próprio coração.

Assim como um humano mordendo uma maçã, eu afundei minhas presas no meu coração — “se eu o mato, eu o como” é uma regra de aço.

Não há muito que eu possa fazer quando sou explodido aos pedaços, mas a regra ainda se mantém mesmo que eu mesmo seja o alvo.

Gulp, gulp.

Ooh, suculento.

Como o esperado do meu próprio coração.

Comida fresca é a melhor — mesmo que ela esteja morta.[1]

“Tu és imortal? Entendo. Muito admirável, Suicide-Master.”

Disse Princesa Acerola, comendo o seu pot-au-feu caseiro. Parecia ser uma admiração sincera.

Como agora ela sabia que eu era um vampiro, ela não mostrava tanta preocupação quanto antes, quando deitara a minha cabeça em seu colo — eu senti-me um pouco desapontado com isso... mas será que isso significa que eu estou sendo cativado pela sua beleza, como eu diria?

“Receber tal lisonjeio é a maior das honras, Princesa Acerola... Então, eu voltei-me contra mim novamente, ao tentar comê-la?”

“De fato, isso é correto. Mas, por favor, não te preocupas, Suicide-Master. Isso é culpa de minha excessiva beleza.”

Essa fala não soou como uma ostentação arrogante, mas sim como se Princesa Acerola se sentisse genuinamente responsável pelas minhas duas mortes.

Não há necessidade de ela sentir-se responsável.

A beleza daquela disposição dela quebraria os corações próximos ainda mais — se eu for descuidado também, ficarei aflito por fazer a princesa sentir-se assim, e temo que eu possa cometer suicídio novamente.

Quantas pessoas essa mulher viu morrerem assim?

“Parece que eu causei uma grande quantidade de problemas neste país também.”

Problemas, hein.

Tu destruíste ele, tão completamente a ponto de fazer um vampiro morrer de fome.

Uma mulher tão bonita que chega a destruir uma nação.

“Eu imploro por teu perdão; eu partirei em breve. Parece que a pessoa cuja eu estou a procurar não está neste país também.”

“......?”

Ela está procurando por alguém?

Eu duvido que ela esteja procurando alguém para comer... mas, o que, ela está procurando por alguém?

Ah, vindo a pensar nisto, isso também estava no conto-de-fadas?

Uma jornada errante em busca de alguém que possa salvá-la — isso mesmo, é isso que aconteceu no conto-de-fadas da Princesa Beleza.

Porém, mais importantemente... partir?

Ei, ei.

Não há como eu perdoar isso.

“Egoísta, isso é.”

Eu disse.

Eu realmente não podia tolerar ela indo a outro país, então a fala veio do meu coração, porém eu não estava tentando dar início a uma discussão — longe disto, como um vampiro, eu estava francamente embaraçado por dizer algo tão virtuoso.

“Quantos cadáveres tu pretendes deixar para procurar por alguém que possa te salvar? Quantos países tu destruirás somente para te salvar?”

“Tu estás me dizendo para morrer?”

Eu pensei que ela ficaria um pouco agitada, mas, contrária às minhas expectativas, Princesa Acerola respondeu com uma quieta compostura — como se qualquer conflito já houvesse sido resolvido.

Eu não estou dizendo para ela se matar, no entanto.

Afinal de contas, se eu quero comer algo, eu mesmo o mato.

“Se eu pudesse me matar... se eu fosse capaz de dar um fim à minha própria vida, seria mais fácil. Contudo, se o mesmo problema ocorrer novamente algum dia, se houver alguém na minha circunstância que deva tirar sua própria vida, não haveria ninguém para salvá-lo.”

“......”

Eu estou ficando confuso. Eu não entendo realmente o que ela está dizendo — escolher a morte porque as coisas são dolorosas e cruéis é apenas fugir, é isso que ela está dizendo?

Hah, quão tão justo.

Mas essa justiça excessivamente bela é um veneno aos fracos — essa justiça massacrara todas essas nações e todas os seus povos.

Morte por envenenamento.

Morte pelo veneno da beleza.

A maldição de uma bruxa.

Porém, nesta altura, ela se tornou algo tão temeroso quanto a própria bruxa — bem, não importa que objetivos ela tenha e que estilo de vida ela escolha ter, isso é apenas um problema de preferência individual, e não tem nada a ver comigo.

Mas eu não podia contar isso a ela.

Sendo humano ou vampiro, a minha política é de não forçar o meu sistema de valores garganta abaixo em outras pessoas (a única coisa descendo na garganta dela é a sopa). Entretanto, o objetivo dela e a maneira como ela vive ao tentar alcançá-lo são diretamente danosos a mim.

Eu não estou sendo estrito apenas porque continuo cometendo suicídio ao tentar matar Princesa Acerola.

Se ela continuar sua jornada na tentativa de salvar a si mesma e ao futuro, no pior caso, isso poderia levar ao colapso da humanidade — considerando a sua falta de ciência do fato de que ela está matando o presente a fim de salvar o futuro, existe uma probabilidade notavelmente alta de tal desastrosa conclusão.

Eu sou um monstro.

Uma esquisitice, um monstro, um vampiro.

O que acontecer com a raça dos humanos não é de nenhum interesse meu — não é isso que eu estou dizendo. É um problema de vida ou morte.

Eu sou imortal, mas é por ser imortal que este é um problema de vida ou morte.

Eu já me deparei com uma escassez de alimentos e morri de fome porque o reino foi aniquilado. Na verdade, sou eu que tenho uma necessidade urgente de embarcar em uma jornada — porém, se eu estou procurando por comida e tudo que eu encontro é carnificina por onde eu vá, no mínimo ficarei sem refeições.

O problema com a beleza de Princesa Acerola certamente não era um trivial para mim.[2]

É simplesmente um problema de estoque de alimentos.

Se os humanos forem extintos, os monstros também serão.

Essa é a cadeia alimentar.

Uma cadeia de extinção — concatenando.

Eu não posso deixar isso acontecer.

....... Porém, dito isto, o que eu deveria fazer?

Se eu comer essa princesa aqui mesmo, todos esses problemas seriam resolvidos, mas já que não posso fazer isso, caí em um paradoxo deveras difícil — não, pense com calma.

Eu não gosto de pensar, mas isso não é hora de se permitir gostos e desgostos.

Então, tendo pensado sobre isso, eu, o vampiro preparado para a morte, a inevitável morte, a certa morte, Deathtopia Virtuoso Suicide-Master, descobri um inesperado interesse mútuo com Princesa Acerola, também conhecida como Princesa Beleza.

A Princesa Acerola não quer matar pessoas, e eu quero matar pessoas. A Princesa Acerola acha doloroso continuar vivendo, e eu acho doloroso não ser capaz de comer a Princesa Acerola.

Que tal isto, a oferta e demanda não são simplesmente perfeitas de um para o outro? Eu hei de tomar vantagem disso.

Eu hei de iniciar o preparo da refeição.

Eu falhei duas vezes em devorá-la. Eu matei-me duas vezes.

“Ei, Princesa Acerola.”

Eu a chamei.

Atípico de mim, eu estou sendo cauteloso.

Até agora, eu pretendia enganá-la, porém seria imprudente tentar enganá-la com má intenções.

Má intenções seriam repulsadas de volta para mim.

Com o impulso de mutilar e machucar a mim mesmo.

Então eu tenho que focar em um entendimento mútuo, completamente satisfazendo os desejos da princesa — que procedimento de cozimento complicado isto está se tornando.

“Tu tens alguma perspectiva? Quando tu sair deste país que destruíste, como de praxe, pensas que haverá alguém que possa salvar-te no próximo país que tu visitarás? Que tu não apenas repetirá a mesma coisa tudo de novo no próximo país?”

“Parece que tu entendeste mal; eu não destruo todo país em meu caminho. Eu cuido para que, ao melhor da minha capacidade, ao máximo do que sou capaz, tal coisa não aconteça.”

“Mas há um limite. Tu não és de fato capaz de fazer isso. Eu não posso negar o teu propósito — ou melhor, o teu propósito estético, porém eu posso somente avisá-la de que continuar tua jornada tão irreflexivamente é mal aconselhado.”

Um aviso.

Que eu daria aquilo que eu mais odeio receber...

Há um limite para o quão fora do personagem eu posso ficar.

“Isso é verdade...”

Entretanto, Princesa Acerola não recusou o aviso do monstro e o aceitou sinceramente.

Que honestidade.

Um humano pode sucumbir à culpa e escolher o suicídio ao exato momento que testemunhar o comportamento atual da princesa, mas já que sou um vampiro, escapei seguro, apenas por pouco.

“Mesmo que tu digas que é mal aconselhado, eu não sei de nenhuma outra maneira. A não ser que eu continue a vagar, eu não alcançarei uma resposta.”

“Não, isso não é verdade.”

Eu disse.

Aqui vai.

“Escute, Princesa Acerola. Mesmo que tu não tenhas desejado, tu destruíste este reino — isso já foi feito e acabado, então eu não estou te dizendo para preocupar-te com isso, porém não há nada que tu possas fazer. É a verdade inabalável, inalterável. Mas tu podes usar esta situação a teu favor.”

“Usá-la — a meu favor...”

“Se tu não se apressar em pânico, contanto que tu permaneças neste reino, neste reino morto, tu não precisas te preocupar em matar alguém.”

Bem, isso não é uma mentira; ela estando preocupada em matar ou não, não existe mais nenhum humano para se matar.

Isso está na área segura do que se dizer.

“O que tu estás a dizer? Eu estou preocupada em matar a ti, Suicide-Master. Eu não posso permanecer aqui enquanto tu estás tentando me comer — eu acabarei matando-te novamente.”

Ela está completamente séria.

Não por que ela não quer ser comida, mas porque ela não quer que eu me mate ao tentar devorá-la — deveria dizer que ela tem um coração mole? Ou isso é simplesmente sua beleza?

Porém isso ainda é uma preocupação desnecessária.

Não há nada com o que se preocupar.

“Eu sou um vampiro imortal, sabes. O vampiro preparado para a morte, a inevitável morte, a certa morte, Deathtopia Virtuoso Suicide-Master. Morrer não é nada para mim. Escute, princesa. Deixe-me lhe contar, não existe mais ninguém como eu — mesmo que eu fique perto de ti, continuarei a voltar à vida não importa o quanto eu morra. Eu sou a única coisa em existência que tu podes consultar.”

“Consultar?”

Apesar da inteligência afiada da “Princesa Beleza”, ela pareceu surpresa, como se isso fosse uma proposta completamente inesperada.

“Sim. Eu sou todo pedaço do monstro que tu vês agora, porém eu sou mais do que teus olhos podem ver — eu tenho um pouco de conhecimento em feitiçaria. Faz parte de ser sobrenatural, sabes? Então, eu deveria ser capaz de te ajudar a descobrir uma maneira de desfazer a maldição da bruxa — que tal?”

“......”

Em outras palavras.

Após ponderar por um pouco, Princesa Acerola me encarou diretamente.

Aquele olhar intenso certamente não poderia ser descrito como a fragilidade de uma trágica princesa — mesmo que ela não tivesse sido amaldiçoada por uma bruxa, se eu não for cuidadoso, posso acabar sendo exterminado de toda maneira.

“Isso significa que, em troca de receber a tua ajuda, tu me deterás em teu território e buscará por uma chance de comer-me?”

Resposta correta.

Sendo um pouco mais preciso, se eu pudesse inventar um modo de suportar a sua beleza de alguma forma, ou pelo menos enfraquecê-la para que ela não aniquilasse toda a humanidade, eu tenho certeza de que poderia comê-la também.

Como remover o veneno de um baiacu, por assim dizer.[3]

Combinando os nossos interesses em comum.

Isso é longe do perfeito.

Mas existe mais algo em que nós possamos concordar?

Se Princesa Acerola alcançar o seu objetivo, meu desejo de comê-la será satisfeito ao mesmo tempo — a humanidade não terá mais de suas nações destruídas, e ninguém perde nada.

Para alguém que odeia pensar, eu ajeitei uma receita bastante excelente na hora, não?

“Tu me convenceste. Parece que não há nada a se fazer a não ser cooperar contigo, Suicide-Master.”

Princesa Acerola disse, suspirando profundamente.

Mesmo aquele ato melancólico era belo.

Não, o que era ainda mais belo era a força de sua determinação para cooperar até mesmo com um monstro como eu pelo bem de seu propósito.

Ou talvez ela pensou que recusar a única proposta de meia-tigela que eu pudesse inventar poderia me levar a tirar minha própria vida novamente; talvez eu hei de dizer que essa compaixão em si era o mais belo.

Bem, está tudo bem.

Se eu posso comer o que mato, está tudo bem.

Se eu posso simplesmente seguir essa regra, falando em termos gerais, nada mais importa.

“Bem, estou ansioso para que trabalhemos juntos.”

Princesa Acerola estendeu sua mão direta para mim; ela realmente o fez, isso não foi uma metáfora.

Dependendo do tipo, existe a possibilidade de drenagem de energia através das mãos dos vampiros — então isso deve ter requisitado uma quantidade tremenda de coragem.

Quando ela deitara a minha cabeça em seu colo como uma almofada, tudo no que eu podia pensar era sobre comer suas pernas primeiro, porém agora eu quero começar com a carne do peito.[4]

Apertos de mão não são um costume deste reino, mas, por enquanto, nós seremos parceiros trabalhando em conjunto para resolvermos os nossos problemas, então eu devo combinar com ela pelo menos nessa quantidade.

Eu apertei a mão direita da Princesa Acerola.

Foi a primeira vez que eu toquei diretamente sua pele, sua carne, sem ser bloqueado por roupas — que sensação; eu poderia simplesmente afundar-me nessa suavidade.

Eu perdi controle de mim mesmo, e então...

Notas do Tradutor[edit]

  1. O japonês contrasta a palavra para “fresco” (生き, iki), que também significa “vivo”, com um termo para “morto” (死んでる, shinderu).
  2. O japonês emprega um trocadilho em “bibi”, substituindo 美々 (caracteres para “beleza”) por 微々 (trivial).
  3. Baiacus podem ser fatalmente venenosos se não forem preparados por um chef experiente.
  4. A palavra para “coragem” (度胸, dokyou) contém o caractere para “peito” (胸, mune).


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