Difference between revisions of "Zaregoto:Volume 1: Capítulo 3.1"
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Que o macaco morra, que o porco também morra.
1
Eu acordei devido à batida violenta na porta. Estando meio sonolento eu me levantei e quando abri a porta, a Hikari-san entrou no quarto e segurou fortemente no colarinho da minha camisa.
“Seu filho da puta!”
De repente a Hikari-san disse isso para mim como se estivesse gritando.
Não, eu percebo que ela não é a Hikari-san. Minha mente fez 5000 rotações em um segundo e com isso compreendi que a Hikari-san não diria algo como <Seu filho da puta>. Um ato físico como esse, de falar isso e ainda segurar o meu colarinho, é fisicamente impossível. A Hikari-san não tem essa habilidade. Então, é…, a Teruko-san também não pode ser, então… É a… Akari-san?
“Por sua causa… Merda! Seu canalha!”
Mas, mesmo que seja a Akari-san não consigo acreditar em uma situação como essa. A Akari-san está completamente exaltada ao ponto de que não seria estranho se ela estivesse batendo em mim agora. Não, ela já bateu algumas vezes no meu peito. Por causa dessa atitude da Akari-san eu acabei não conseguindo nem sentir dor.
“Já estou, cansada, disso…”, a Akari-san começou a tremer como se estivesse sem ar. “Já estou cansada disso… Não quero, não quero… Porque, porque… Porque!”
“Se acalme Akari-san”, eu segurei os ombros da Akari-san e balancei o seu corpo. “… Aconteceu alguma coisa?”
“…”
E a Akari-san olha para mim fixamente.
Com olhos repletos de ódio.
Com um olhar de alguém que detesta alguém do fundo do coração.
E com pupilas que demonstram muita tristeza.
Ela me olha fixamente, com raiva.
Fomos treinadas dessa maneira. E ontem, a Hikari-san não tinha dito isso? O <treino> pelo qual a Hikari-san passou, a Akari-san também deve ter passado. Mesmo assim, ela perdeu o seu autocontrole. Afinal, o que aconteceu?
Aí a Akari-san balançou sua cabeça levemente.
“… Desculpa. Perdão. Mostrei uma cena muito vergonhosa…”, então a Akari-san abaixa sua cabeça. “Não é sua, culpa… Isso… Não é sua, culpa…”
“… Não me importo com isso, mas… Aconteceu alguma coisa?”
Eu repito a pergunta.
“Por favor, me diga. Se aconteceu alguma coisa.”
“…”
A Akari-san respirou fundo, se virou de costas, “Venha até o armazém no primeiro andar”, e depois de falar isso, foi andando nessa direção.
Eu fico parado de pé.
“… O que foi…? Aquilo…”
A Akari-san tinha ido com a Teruko-san para o continente, então quando elas acabaram voltando? Olhei o relógio que a Kunagisa tinha consertado (letras espelhadas e por isso foi difícil reconhecer, mas) e vi que já eram dez horas. Como eu acabei dormindo até esse horário. Isso é uma vergonha.
Não, agora não é hora pra isso. Não importa quando a Akari-san tenha voltado, que horas sejam agora, que eu tenha dormido demais, essas coisas são meros detalhes. Mais do que isso—
Mais do que isso.
“O que a Akari-san disse agora…”
Armazém do primeiro andar…?
Tenho um mau pressentimento.
Quem está lá?
Tenho um mau pressentimento.
O que está acontecendo agora nessa ilha?
Tenho um mal, pressentimento.
E isso, provavelmente, está correto.
Como sempre foi até aqui.
“Eu, acorde Tomo.”
“… Uni…? … Hayon1. Ii-chan amarra meu cabelo.”
A Kunagisa que ainda estava com os olhos sonolentos, levantou sua cabeça. A Kunagisa estava com uma expressão alegre, como se tivesse visto um bom sonho.
“Não é hora pra isso, Tomo.”
Ouvindo a minha frase a Kunagisa, como se estivesse fingindo que não ouviu “Então, não precisa lavar o rosto, né”, e disse.
2
Uma porta semi-aberta.
A Akane-san estava caída bem nessa direção. Por isso, dava para ver claramente o corte, a carne, os ossos, os vasos sanguíneos, dava para ver. Dava para ver esse corte, que é grotesco, que dá a impressão de que os humanos não passam de matéria orgânica para a alma.
Sim.
De novo um cadáver sem pescoço.
Assim como o cadáver da Kanami-san, cortado da base do pescoço.
Isso estava usando um terno. Um terno cinza que parece ser muito caro. Mas ele estava coberto de sangue e por isso já não servia mais para ser usado. Mesmo que ainda desse para usá-lo, assim como o vestido de ontem da Kanami-san, ninguém mais iria querer vesti-lo.
Um quarto com a imagem da morte.
Eu passei três dias aqui.
A Akane-san não conseguiu passar nem uma noite.
Um quarto que não tem nada.
O que tem é uma mesa de madeira encostada na parede, uma cadeira, o telefone de linha interna perto da parede, um cobertor, alguns livros que a Akane-san trouxe e uma lâmpada de mesa.
“… Estava trancado, não é”, e a Iria-san perguntou. “Não é Hikari?”
“Sim…”, e a voz da Hikari-san ao responder estava trêmula. Vendo melhor, o seu pequeno corpo também estava assim. “Com certeza, absoluta…”
“Então, pela janela?”
Ao ouvir a voz da Iria-san eu olhei para cima.
Do lado contrário ao da porta, na parede contrária a onde eu estou, no lugar mais alto há uma janela retangular. Mas, aquela janela só serve para ventilação e iluminação, e não acho que é lugar possível para que alguém se infiltre e consiga—
A janela estava aberta.
É uma janela que só abre devido a uma alavanca que pode ser controlada por dentro. Com certeza, se forçar é possível que tenha espaço para uma pessoa entrar e sair.
Mas, isso é, muito.
“É muito alto…”
Eu respondi para ninguém.
Para entrar seria o mesmo que pular do segundo andar, e para sair então, seria ainda mais complicado. Eu escolhi esse lugar para servir como confinamento bem por causa da posição da janela, o que faria a entrada e saída ser algo impossível.
Isso quer dizer que é impossível entrar ou sair pela janela.
Mas.
A única outra entrada que é a porta, estava trancada.
Então.
É outro quarto fechado.
Segundo cadáver sem pescoço, segundo quarto fechado.
Segundo cadáver sem pescoço que apareceu e segundo quarto fechado que apareceu.
Unya, a Kunagisa do meu lado soltou isso de sua boca.
Eu pensei em falar algo, mas parei.
Na nossa frente está o cadáver da pessoa que era suspeita de ser a culpada. Não, não, é realmente necessário falar alguma coisa em uma situação como essa?
Não dá para ver a cabeça.
Isso quer dizer que como aconteceu com a Kanami-san, é impossível ter sido suicídio ou uma morte por acidente…
“Por enquanto parece que é necessário repensar várias coisas”, e finalmente a Iria-san disse. “Será que todos podem se reunir na sala de jantar? Hikari, tranque esse quarto.”
A Iria-san foi novamente a primeira a sair. A Rei-san seguiu em silêncio logo atrás dela.
“Necessário repensar várias coisas…?”
Eu disse isso de forma auto-depreciativa. Com certeza é desse jeito. É necessário voltar a pensar sobre a situação considerando tudo que foi pesquisado e considerado até agora. E então, é necessário pensar sobre ainda mais coisas.
“Assim, se tornou em um assassinato em série…”
Realmente, de forma auto-depreciativa, eu sussurrei mais uma vez.
Assassinato em série.
Para prevenir isso eu deixei a Akane-san confinada aqui. Mas, como resultado, ela se tornou a segunda vítima.
Criar uma situação de proteção? O que eu estava esperando. O que eu estava esperando de uma pessoa que mata as outras, corta os pescoços das outras. Eu estava mesmo esperando que ele pensasse como um humano normal?
Fiquei aliviado.
Eu fiquei aliviado.
Uma completa presunção.
Achando que faria o culpado não conseguir mais se mover. Se achando. Pensando alto.
Começo a relembrar cada uma das palavras de ontem de noite da Akane-san.
As palavras que ela disse para mim.
“…”
Dá para perdoar? Algo assim…
“É um zaregoto, realmente…”
Eu me virei e fiquei de costas para esse lugar.
Nesse momento no canto de minha visão a Yayoi-san apareceu. Ela estava muito pálida. Ainda mais do que ontem. É claro que ver dois cadáveres sem pescoço por dois dias seguidos deixaria alguém passando mal. É diferente de carne de porco ou de frango.
Mas, ainda assim—e, percebendo o meu olhar a Yayoi-san rapidamente começou a andar na direção da sala de jantar como se estivesse fugindo de mim.
“…?”
O que foi aquilo, enquanto eu pensava isso, a Kunagisa puxou o meu braço.
“Ii-chan, vamos logo. A Iria-chan deve estar cansada de esperar. Todo mundo já foi, não adianta ficar aqui.”
“Ah… Ah, é mesmo.”
Eu assenti.
Repensar e pensar em novas coisas.
Seja como for, a manhã do quinto dia foi péssima.
3
“Foi por volta das duas da manhã”, e disse a Hikari-san.
Sala de jantar.
Mesa redonda.
Comparado a apenas dois dias atrás, duas pessoas não estão mais presentes. <Pintora gênio> Ibuki Kanami, <Uma das Sete Tolas> Sonoyama Akane.
As duas que estavam discutindo na janta de dois dias atrás, já não estão mais aqui. Já não vivem mais.
“No meu quarto tocou o telefone, era a Sonoyama-san… Assim, ela queria que eu levasse um livro que ela queria ler e tinha esquecido no quarto.”
“Então?”, e disse a Iria-san. “Você obviamente levou o livro como ela tinha pedido, certo?”
“Sim”, e assentiu a Hikari-san. “O livro que eu levei era o <Baka Ichi> do Mushanokouji Saneatsu, um livro de bolso já meio velho.”
“Isso não tem importância. Nesse momento, então, a Akane-san ainda estava viva? Tinha mesmo tudo pra cima do pescoço?”
“Sim. Nesse momento estava viva.”
A Hikari-san afirmou.
Isso quer dizer que a Akane-san foi morta depois das duas da manhã. Tinha certeza que eu tinha sido a última pessoa a encontrar com a Akane-san e por isso me surpreendi um pouco. Não, na verdade eu só conversei com a Akane-san através da porta e não encontrei de fato com ela.
Parece que o cadáver da Akane-san foi encontrado por volta das nove e meia da manhã. A Akane-san sempre acorda cedo de manhã e vai tomar café em um horário definido e como a Hikari-san achou estranho o fato de não ter havido nenhuma ligação, ela acabou se tornando a primeira a descobrir.
No começo ela achava que ela teria dormido mais que o normal por ter trocado de quarto, mas… A verdade era diferente. De qualquer jeito, se o que a Hikari-san disse é verdade, o horário do crime fica limitado em sete horas e meia. Como o cadáver da Akane-san não passou a impressão de que ela foi morta a pouco tempo, é certo dizer que o crime ocorreu durante a noite.
“Então”, e a Iria-san olhou para todos. “Como ontem, vamos fazer uma investigação sobre os álibis.”
O jeito dela falar até faz parecer que ela está se divertindo com um jogo. Não tenho como saber o que a Iria-san sente, mas parece que sentimentos como tristeza ou depressão não tem ligação com ela.
Okay. Com certeza para qualquer um, isso não passa de conversa dos outros. É só isso.
“Dessa vez eu não tenho álibi”, como ninguém abriu a boca eu decidi começar.
“A Hikari-san veio nos visitar e lá pelas dez ou onze horas da noite eu e a Kunagisa entramos na cama e fomos dormir.”
“Juntos na mesma cama?”
A Iria-san perguntou enquanto sorria.
“Capaz. O entrar na cama é só uma figura de linguagem. Eu dormi no sofá.”
“É mesmo… Como dormiram não tem como saber se um dos dois saiu do quarto, não é?”
“Uni uni. Pra Bokusama-chan é impossível”, a Kunagisa levou sua mão da frente do pescoço para o lado. “O lugar do crime foi no armazém do primeiro andar, certo? Bokusama-chan não consegue descer as escadas sozinha.”
“Eh?”
Não só a Iria-san, mas todos olharam surpresos, assustados para a Kunagisa. Não, só uma, só a Maki-san estava com um ar de <Já sabia disso> e mandou um olhar entediado, mas a Maki-san é uma exceção.
“Por isso Ii-chan tá acompanhando Bokusama-chan.”
Sim. Até eu não viria para essa ilha só porque estava entediado ou com interesse. Estou aqui porque existe uma razão para isso, porque sou necessário a Kunagisa Tomo.
A Kunagisa tem várias disposições, peculiaridades que prejudicam o seu dia-a-dia, mas dentro deles existem três que são mais importantes. Um deles é que ela não consegue se mover verticalmente sozinha.
Essa é uma regra.
Mais do que temperamento ou disposição, peculiaridade, isso é uma regra forçada, transcendental, rigorosa que existe no cérebro da Kunagisa. Se tentar forçar isso, ela age violentamente, chora e não é mais possível controlá-la. Era assim também há cinco anos atrás. Até pensei que podia ter melhorado, mas parece que não é algo tão simples assim.
“É verdade…?”, a Iria-san continua com sua expressão assustada. “Mas é a primeira vez que ouço falar disso…”
“Não é algo que preciso falar, né. Mas se prestar atenção não seria estranho que alguém tivesse descoberto. Afinal Bokusama-chan desde que veio para essa ilha nunca se moveu verticalmente sozinha.”
Na hora das refeições eu sempre estava com ela. Se não era por isso, ela estava sempre trancada no quarto.
Kunagisa Tomo.
“Por falar nisso, essa pessoa sempre ia buscá-la… Fun…, mas isso é algo que nós não podemos confirmar.”
“Tem um atestado médico”, e eu disse. “Como é uma desordem psicogênica, dá pra dizer que é um tipo de problema mental. Com isso dá pra garantir o álibi da Kunagisa.”
Embora o meu não seja possível.
“…” A Iria-san parecia estar pensando um pouco, mas trocando de pensamento, “Então, e a Himena-san?”, perguntou isso para a Maki-san.
“Eu passei a noite no meu quarto bebendo”, e olhou para o Shinya-san. “Junto com esse maravilhoso cavalheiro.”
“É mesmo, Sakaki-san?”
“Deixando de lado se eu sou um cavalheiro ou não, é verdade.” O Shinya-san assentiu levemente às palavras da Maki-san. “Tinha a intenção de dar só uma passada lá, mas… No fim, acabei bebendo a noite inteira.”
Por dois dias seguidos, passando a noite bebendo. Grande resistência. Não, no caso do Shinya-san não é problema de resistência. Deve ser somente porque ele queria beber, depois do que aconteceu com a Kanami-san.
Agora consigo ter uma idéia de quão importante era a existência da Kanami-san para o Shinya-san. Ensinou a pintar e o superou. Pessoa importante. Existência importante.
“Não é como se eu ou a Himena-san estivéssemos embriagados, então acho que é possível confirmar o álibi de cada um”, e disse o Shinya-san. “Deixa eu ver…, foi por volta das uma da manhã. Não conseguia dormir… Afinal aconteceu aquilo. Fui para a sala de estar e lá estava a Himena-san. Então fui convidado para ir ao quarto dela e até de manhã…”
“…”
Parece que foi isso. Mesmo que não tenha sido isso, deve ser verdade que ele estava no quarto da Maki-san. Isso quer dizer que no fim a Maki-san e o Shinya-san tem álibis com certeza.
“Eu estava dormindo no meu quarto”, antes que perguntassem, como se estivesse mantendo a ordem, a Yayoi-san disse. “Não tenho álibi. Acordei às seis e comecei a fazer o café da manhã; e como a Hikari-san estava me ajudando, acho que aí ela pode garantir, mas…”
A Yayoi-san falava de maneira meio ambígua, enquanto prestava atenção na expressão da Iria-san. Essa ação meio estranha, fez com que eu sentisse que tinha algo de errado. Não sei direito o que é, mas chama a atenção. Só que eu não sabia a origem dessa sensação de desconforto.
“Fun”, e a Iria-san fez um beicinho. “Então, Hikari. E você?”
“Eu, então, às duas entreguei o livro para a Sonoyama-san…, e voltei a dormir. Até acordar de manhã não tenho nenhum álibi.”
“É… Ah, eu também tenho que dizer, não é? Eu passei a noite no meu quarto com a Rei conversando. Falando sobre o Aikawa-san que a Akari e a Teruko foram chamar, assim como outras coisas. Não é, Rei?”
A Rei-san assentiu em relação a pergunta da Iria-san.
“Como dormi ontem de tarde, não consegui dormir de noite. Como a conversa só acabou perto da manhã, achei que não era bom dormir nesse horário, e por isso… Sim, o café da manhã. Acho que isso é um álibi, o que acham?”
Depois de falar isso a Iria-san, não sei porque, olhou para mim. Esse era um olhar muito provocador. Eu encolhi os ombros “É mesmo”, e respondi. “Quando a Akari-san e a Teruko-san voltaram?”
“Por volta das nove.”
Quem respondeu, foi a Akari-san, que agora pouco tinha me segurado no quarto da Kunagisa. Agora ela já recuperou completamente a calma, mas ela tenta não trocar olhares comigo.
“Nove horas…”
Falando nisso, naquela hora a Akari-san estava falando algo estranho. Algo como, já estou cansada disso… Mas sobre o que ela está <cansada>? Não importa como, aquele jeito da Akari-san não era normal…
E não parecia que isso se referia ao incidente da Kanami-san…
“Então, pode-se dizer que a Akari e a Teruko tem álibis, não é. Assim…”, e a Iria-san disse. “Quem tem álibis são o Sakaki-san e a Himena-san, eu e a Rei. Akari e a Teruko. E vamos considerar a Kunagisa-san também. Sete pessoas.”
De maneira contrária, eu, a Sashirono Yayoi e a Chiga Hikari. Essas três pessoas não possuem álibis. Mas, apesar da questão dos álibis ser um problema, nesse caso tem outro problema maior.
“Hikari-san.”
“Sim?”, e a Hikari-san olha para mim.
“Vou perguntar algo mais detalhado, mas às duas horas quando você entregou o livro, a janela do armazém estava aberta? Ou estava fechada?”
Depois de olhar para cima, fazer um gesto de como estivesse pensando um pouco a Hikari-san respondeu, “Acredito que estava fechada”.
“É mesmo. … Aquela janela pode ser aberta livremente, não é?”
“Sim, afinal é uma janela com o propósito de ventilação…, desde que se use a alavanca, … Desde que se gire a alavanca dessa maneira é possível abrir ou fechar livremente. Mas isso só do lado de dentro, já que não é possível abrir pelo lado de fora. Está completamente fixo.”
“É mesmo…”
Se for assim, o problema fica ainda mais complicado. E além do mais, a direção para onde está ficando complicado é muito ruim. Uma janela que está a mais de três metros de altura. Sem o uso de uma escada, não acho que seria possível sair de lá, muito mais conseguir entrar.
Quer dizer que é um <quarto fechado>.
“… Então, Hikari-san, como é feito o controle das chaves daquele quarto? Será que não tem uma chave duplicada em algum outro lugar?”
“Eu estive sempre com a chave. Não tem chave mestra, nem alguma chave duplicada.”
A Hikari-san disse isso um pouco preocupada. Isso é. Afinal essa frase quer dizer que a única pessoa capaz de cometer esse crime era ela. Não, interpretando essa situação como um observador, no momento essa é a possibilidade mais alta.
Mas, eu não fiz nada que pudesse indicar isso. No caso da Akane-san, nós acabamos falhando gravemente.
“Qual é o tipo da chave?”
“É normal. Assim, girando a chave, a fechadura fica travada por causa de uma lâmina… Não sei o nome oficial, como será que se chama?”
“Às duas, realmente trancou o quarto, certo?”
“… Tranquei. Com certeza, tranquei. Confirmei isso inúmeras vezes…”, a Hikari-san respondeu a isso aparentando estar um pouco triste. “Com certeza fiz isso.”
“… É mesmo.”
É uma pessoa sincera.
Uma pessoa sincera até demais.
Por causa desse jeito da Hikari-san eu conclui que ela não era a culpada. Supondo que a Hikari-san seja a culpada, não havia a necessidade dela falar para todos que ela tinha sido chamada no meio da noite, ou trancado o quarto. Para qualquer pessoa isso seria óbvio.
Mas é claro que não se pode desconsiderar que isso tem a chance disso ser parte de algum plano. Ficar pensando nisso não tem fim.
Eu continuo com as perguntas.
“Às duas horas quando você visitou o quarto, não havia outra pessoa lá dentro? O quarto estava escuro, então pode ser que alguém estivesse escondido…”
“Não havia a presença de outras pessoas”, sem entender direito o sentido da minha pergunta a Hikari-san respondeu enquanto inclinava levemente seu rosto. “Mas, não tenho como afirmar isso. Afinal eu não entrei no quarto. Entreguei o livro na entrada.”
“Não estava com medo…?”
De repente, a Yayoi-san perguntou isso com uma vez muito fraca. A Yayoi-san com um rosto muito preocupado continuou a falar, enquanto prestava atenção na Hikari-san.
“Podia ser que a Sonoyama-san pudesse ser a culpada, sabe…? Além disso, encontrar com ela no meio da noite… Não estava com medo?”
“… Não, não senti isso”, a Hikari-san depois de ter ficado um pouco perdida, respondeu a pergunta da Yayoi-san. “Eu não acreditava que a Sonoyama-san era a culpada…”
“Por quê?”
Não sei porque, mas a Yayoi-san está agindo agressivamente em relação a Hikari-san.
“Porque, consegue falar algo assim?”
“Isso é…”
A Hikari-san como se estivesse sem saber o que fazer, olhou para mim. Faz sentido, é porque ela ouviu a conversa da Kunagisa ontem. Com certeza, depois de ouvir aquilo não mais razões para só suspeitar da Akane-san.
“…”
Enquanto escutava a conversa das duas, eu pensei. Pensei, mas não consegui chegar a lugar algum. Achei que se algo tivesse acontecido teria sido <às duas horas> quando a Hikari-san foi entregar o livro, mas pelo que a Hikari-san disse, não parece ser isso.
Então, o que fazer…
Como progredir daqui para frente.
“Mas, rigorosamente não é um quarto fechado, certo? Afinal a janela estava aberta”, a Iria-san disse isso para mim. “A partir desse ponto, já está fora da definição de quarto fechado.”
“Mas, não é possível entrar ou sair pela janela.”
“Não havia uma cadeira? Se ficar de pé em cima dela, não alcançaria?”
“Não acho que alcançaria. Mesmo que estivesse com os braços esticados e pulasse não alcançaria. Aqui dentro, a pessoa mais alta é o Shinya-san, mas mesmo para ele não acho que seria possível.”
“… É mesmo. Então isso quer dizer que no caso da Ibuki-san era um quarto fechado por causa do rio de tinta… E agora é um quarto fechado por causa da altura…”, como se a Iria-san estivesse se espreguiçando, esticou seus braços. “E em ambos os casos, um assassinato envolvendo cadáveres sem pescoço…”
Sim, também tem esse problema.
Porque o culpado cortou os pescoços da Kanami-san e da Akane-san? Não tenho nenhuma idéia. O clássico de cadáveres sem pescoço que envolve troca de corpos não tem sentido aqui, mas qual seria outra razão para cortar o pescoço? É só pensar que foi algo bizarro, algo anormal…?
Se pensar ainda mais, não dá para entender a sensibilidade de uma pessoa que leva as cabeças embora. Também dá para pensar que foi cortado para que se pudesse levar, mas para o que se usa a cabeça de uma pessoa morta?
Se falar isso, se chega a pergunta de que teria sido realmente necessário matar, mas… Não sei. Tem muita coisa que não sei. No fim, isso é algo completamente sem sentido.
Merda…
Desde quando eu fiquei tão idiota assim?
“Hmm. Do ponto de vista de um observador, a pessoa mais suspeita é a Hikari.”
E.
Em um timing que você pode dizer que foi repentino, a Iria-san disse isso. Em um instante o rosto da Hikari-san se contorceu.
“Eh…? Ah…, eu…”
“A Hikari estava com a chave e das três pessoas que não tem álibis, uma delas é a Hikari. Se é impossível entrar ou sair pela janela, então só pode-se concluir que a entrada e saída foi pela porta, não é? Três pessoas não possuem álibis, mas a única que tinha a chave era só você—“
“Espere um pouco”, eu interrompi forçadamente a frase da Iria-san. “Isso não é bom. Esse tipo de conclusão não é bom, Iria-san.”
“Conclusão? Não chamam isso de dedução?”
A Hikari-san, preocupada, olhava alternadamente entre mim e a Iria-san. Parece que ela não tem nem idéia do que fazer, do que falar.
“Ontem a Akane-san não tinha dito? Que é idiotice afirmar que alguém é culpado por exclusão ou por viés de confirmação. Eu não vou dizer que chega a ser uma idiotice, mas essa não é a única maneira de decidir isso. Quem conclui, não tem problema, mas não é fácil para quem sofre essa conclusão.”
“Será? Será que é mesmo assim? Eu não acho que seja algo do gênero.”
“Pensando assim, nós decidimos que a Akane-san era a principal suspeita e a prendemos no armazém, certo? E o resultado foi isso. Esse foi o resultado Iria-san. Eu não tenho a intenção de ficar falando sobre esse erro, mas é necessário evitar repetir esse erro. Entendeu, certo? Ficar sozinho é perigoso.”
“Isso é óbvio—“, e a Iria-san mostra um sorriso doce para mim. Um lindo sorriso que eu poderia ter achado atraente, se estivéssemos em outra situação. “Afinal de contas, a Sonoyama-san não foi confinada—ou será que era protegida? No fim, quem deu essa idéia não foi você?”
“É isso mesmo. Sobre isso não tenho nenhuma intenção de inventar alguma desculpa. Quem deu a idéia de confinar a Akane-san não foi outra pessoa a não ser eu. Por isso eu tenho o direito de retrucar agora. Se existe algum tipo de responsabilidade sobre isso, eu acredito que seja não repetir o mesmo erro. Ao menos não acho que esse seja o momento de concluir quem é o culpado. Afinal, ainda não pensamos no mais importante.”
A Maki-san soltou um longo bocejo. Pode ser porque ela não dorme há dois dias, ou pode ser porque a conversa está muito chata. Provavelmente são os dois.
Sua observadora.
“Fun. Mesmo assim, não acho que isso mude o fato de que a Hikari seja a mais suspeita.”
Pela maneira que a Iria-san fala, não dá para sentir nem um pingo de consideração por uma empregada que morou junto com ela e a serviu por muitos anos. Não tem nem um traço de sentimentalismo envolvido. É apenas um modo de falar frio que não demonstra nenhum sentimento e somente conta a verdade como ela é apresentada.
Eu acho que entendi.
A resposta em relação à pergunta de ontem da Kunagisa Tomo.
A razão pela qual essa pessoa foi exilada da família Akagami.
A razão pela qual ela está nessa ilha.
Akagami Iria. Para essa pessoa, esse mundo é igualitário e igualmente não tem valor nenhum. Por isso procura coisas de valor, mas como ela não encontra, ela consegue jogar fora qualquer coisa sem sentir nenhum pesar.
Eu penso no que ela pode ter feito.
Eu penso sobre o que ela pode ter feito.
Mas pode ser que essa seja só uma grande impressão errada por minha parte. Pode não ser que mesmo sem ter feito nada a Iria-san não podia mais ficar na família Akagami? Ou mais do que isso, a Iria-san não foi jogada fora pela família Akagami? Ou vice-versa? Não é bom a conversa chegar a esse ponto.
Mas que coisa.
Tinha certeza de que o papel da Iria-san seria o de proteger a Hikari-san.
“… Então, vamos fazer assim”, eu disse isso sem olhar na direção da Iria-san. “De qualquer jeito, a partir de agora ficar sozinho é perigoso. Por isso vamos agir em times. Assim, não tem reclamações, certo? Iria-san. Não é necessário explicar o porquê de agir em times. É porque é mais seguro do que agir sozinho. E porque cada um pode vigiar o outro. Obviamente, como eu estou do lado da Hikari-san, eu vou formar um time com ela. Eu, a Kunagisa e a Hikari-san seremos o time A. O que acha dessa idéia?”
“Fun. Faz sentido”, a Iria-san disse isso como se estivesse um pouco impressionada. “Ao contrário do que aparenta, até que você tem uma cabeça boa… Vamos ver… Então, obviamente eu, a Rei, a Akari e a Teruko formaremos um time. E então a Maki-san, o Shinya-san e a Yayoi-san formarão o time C. A Yayoi-san pode ficar tranqüila, já que o Shinya-san e a Maki-san podem provar por dois dias seguidos que nenhum dos dois é o culpado. Mesmo que a Yayoi-san seja a culpada, como é dois contra um, a Maki-san e o Shinya-san também podem ficar tranqüilos. Pode ser assim?”
“Mesmo não fazendo isso, se todos ficarem em algum quarto—como nessa sala de jantar, não é melhor? Até o Aikawa-san chegar”, a Hikari-san disse isso enquanto olhava preocupada para mim. “Se for assim, ninguém ficará sozinho e vai se formar uma situação de proteção—“
“Isso não pode. Ficar parado? É uma brincadeira, ter que ficar parado.”
Eu declarei isso não só para a Hikari-san, mas para todos.
“Eu e a Kunagisa temos que agir a partir de agora.”
4
Antes de tudo, o que nós decidimos fazer foi enterrar a Akane-san. Assim como foi para a Kanami-san, deixar o cadáver dela daquele jeito era algo fora de questão. Eu conclui que nós poderíamos fazer o que quiséssemos nesse sentido, já que a Iria-san não tinha nenhuma intenção de chamar a polícia.
Igual a ontem, primeiro a Kunagisa vai gravar a cena do crime com a câmera digital e depois iríamos enterrar o corpo da Akane-san na parte de trás da montanha; e como a Hikari-san está junta conosco nesse time, a princípio fomos pegar a câmera no quarto da Kunagisa. Só que nossos planos acabaram mudando um pouco.
“Uni!”
No momento em que entrou no quarto deu para ouvir o grito da Kunagisa.
Pensei no que poderia ter sido e ao olhar o quarto, logo entendi.
“Isso é, bem…”
“Ah… Uwaa…”, até a Hikari-san soltou sua voz. “Que cruel…”
Destruição.
Era uma destruição.
O que havia dentro era destruição. O três computadores da Kunagisa, dois pcs e um workstation. Eles haviam sido completamente destruídos.
“Wa-! Como é que foi acabar assim!”, a Kunagisa já meio irada se dirigiu aos computadores que nem lembravam mais suas formas originais e que tinham toda sua parte interna à mostra. “Que cruel, cruel, cruel, cruel, é cruel demais! É bullying! È um demônio! Tem um demônio nessa ilha! É o Diabolos, Ii-chan! É uma tragédia! Uwa-! Se isso fosse em um humano, isso seria múltiplas fraturas e rupturas de órgãos internos em todo corpo. Até o monitor tá quebrado! Sentido nenhu-m! Ah, foi tão difícil construir esse teclado-! A memória holográfica-! Mais do que isso, a placa mãe! Mais ainda do que isso, tá quebrada-! O que diabos é isso!”
A Kunagisa perdeu o controle. Entrou aquele switch. Para essa garota tranqüila, esse tipo de situação é algo muito raro. Pelo menos, desde que eu voltei para o Japão, essa é a primeira vez que a vejo assim.
“Normalmente fazem até aqui…? A-a…, que cruel…, Ii-chan. Ii-chan, Ii-chan, Ii-chan. O que, acha disso?”
“Foi um desastre”, mesmo que esses computadores fossem alvos de vingança, eles não seriam destruídos até esse ponto. Os computadores da Kunagisa tinham sido destruídos e batidos a tal ponto que dava essa idéia. “Será que bateram com algum pedaço de metal… Não foi uma maneira muito esperta de destruir… Não, foi com uma machadinha ou algo do tipo…”
“Porque fizeram isso…? Quem será que fez? Foi o culpado mesmo?”
A Hikari-san disse isso como se estivesse sussurrando.
O culpado? O culpado que matou a Kanami-san e a Akane-san foi quem criou essa tragédia? Mas, o que isso tem de significado? O que o culpado ganha ao destruir os computadores da Kunagisa?
“Uni-. Coitada da Bokusama-chan. Quero chorar”, a Kunagisa disse isso quase que chorando enquanto se afastava dos computadores. “Ha-… Bem, … Deixa quieto. Já tinha mandado o backup pra minha casa. Mas ainda assim. Agora que tava construído…, essa situação é algo que não imaginava. A partir de agora, será que construo uma placa mãe com materiais que sejam difíceis de serem quebrados?”
“É mesmo… Ajuda saber que tinha backup. O software que estava construindo não foi desperdiçado.”
Mas, pra falar a verdade, isso não ajuda muito. Os computadores que a Kunagisa usava, ao contrário dos modelos comuns e incompletos, era completamente original, tanto que o exterior valia mais que o interior.
“Uni. Com isso não dá mais pra ver o que tá gravado na câmera digital. A câmera e o celular também parecem que foram destruídos… Mas que cruel. O que acham que é dinheiro.”
“Você não tem direito de falar isso”, e depois de ter dado esse tsukkomi, eu percebi. “Hm. …Ah, é isso.”
Eu dei um estalo. E para confirmar, a câmera digital tinha sido destruída completamente. Assim, fica claro o objetivo do demônio destruidor.
“Faz sentido…, faz sentido. Muito simples”, eu, sozinho, sussurro. “Hm…, é bom que isso seja simples. Até estava pensando no que fazer se ficasse ainda mais complicado.”
“O que você quer dizer com isso?”, uma pergunta da Hikari-san. “Descobriu porque isso aconteceu?”
“Sim. Por enquanto. A Hikari-san viu ontem também, certo? As imagens do atelier da Kanami-san gravadas na câmera digital sendo passadas para o HD por um cabo USB. Deixando de lado se o culpado sabia até aí, ao que parece essas imagens atrapalhariam ele.”
O workstation e o celular foram destruídos só por prevenção.
O quarto da Kanami-san.
Aquelas imagens.
“O objetivo era provavelmente esse.”
A informação do Chii-kun, sobre aquele e-mail ninguém mais sabe, então não tem como o culpado também saber, mas todos sabiam das imagens da câmera digital. Era isso, e a Kunagisa deixa seus ombros caírem.
“A-a. Se fosse assim, não devia ter colocado aquele tipo de proteção… Nunca achei que seria usado força bruta.”
“Nesse quarto não tem chave…”, e disse a Hikari-san. “Foi azar mesmo.”
Eu acariciei a cabeça da Kunagisa.
“Fazer o que… Agora não dá mais pra ficar esperando calmamente a chegada do detetive-san”, eu coloquei minha mão sobre um dos ombros da Kunagisa. E a abracei, só um pouco. “Realmente… Já não dá mais pra ficar calmo.”
Não sei quem é o culpado, não sei quem é o culpado, nem sei ao menos o objetivo dele. Mas tem uma, só uma coisa que é certa.
Esse cara destruiu por alguma razão qualquer dele, algo importante da Kunagisa Tomo.
Okay,
Agora eu também não vou mais ter dó.
“Eh? Ué? Espera, espera um pouco”, e de repente a Hikari-san disse isso como se tivesse se tocado de algo. “Quem, fez isso?”
“… Então, não foi o culpado? Agora quem é, ainda não dá para saber.”
“Mas, nós estávamos o tempo todo na sala de jantar e viemos direto pra cá, não é? Quem teve tempo para destruir tudo isso nesse curto período?”
Fui pego de surpresa.
Até a Akari-san chegar, nós estávamos nesse quarto. E quem chegou por último na cena do crime fomos nós também. Quando chegamos ao armazém, todos já estavam lá. E depois todos foram para a sala de jantar.
Se for assim—não, se for assim, que se dane o resto. Logicamente, ninguém, ninguém poderia ter causado essa destruição.
“…? Mas, não importa como se veja, isso é uma destruição feita por alguém… Isso. Mas para isso, ninguém tinha tempo suficiente? Então, o que…?”
Não sei. Realmente, eu também não sei sobre isso. Assim como o quarto fechado da Kanami-san ou o cadáver sem pescoço da Akane-san…, não.
Isso está errado. O <não sei> de agora é de um tipo diferente dos outros. É de um tipo que não tem sentido nenhum que supera os outros e não tem nada a ver com álibis ou motivos. Não tem nada de truques ou artifícios, é o <impossível em si>.
Se for assim.
“Se for assim, essa é a chave…?”
Eu olho para a Kunagisa. Eu olho para a Hikari-san.
E penso.
“…”
Se essa é a chave.
Então onde estará a porta?
5
Depois de concluirmos que não havia mais nada para se fazer em relação aos computadores destruídos, nós decidimos agir como planejado. Quer dizer, enterrar a Akane-san.
Fomos ao armazém, colocamos o corpo da Akane-san em cima de uma maca grande e fomos para a parte de trás da montanha. Essa maca foi providenciada para a mansão em caso de emergência, mas não importa como, esse tipo de caso de emergência não poderia ter sido suposto.
Não…
Pode ser que tenha sido suposto.
Dessa vez, enterramos diretamente e não coberto com um saco de dormir. A Hikari-san estava levando a parte da frente da maca e eu estava na parte de trás. Hikari-san, realmente tem experiência como empregada e apesar do seu pequeno corpo, ela até que tem resistência física e força nos braços. A Kunagisa estava levando a pá e andava atrás de mim.
“Eu estou carregando a parte de trás da maca, então inevitavelmente eu acabo tendo que olhar fixamente para o corpo da Akane-san, para esse cadáver sem pescoço. Mesmo que eu esteja acostumado, não é uma sensação boa ficar olhando por muito tempo.
No meio do caminho, eu me lembrei e perguntei para a Hikari-san.
“Hikari-san. A roupa da Akane-san, essa, é igual ao que ela estava usando ontem de noite?”
“Sim, é a mesma”, e responde a Hikari-san. “Claro que nessa hora ainda havia a cabeça também.”
Uma frase redundante (jyouku)2 que não dá para rir.
Mesmo fazendo isso, isso não é uma piada.
Como a câmera foi destruída ao ponto de que é impossível consertá-la, é óbvio que não teve como se gravar a cena do crime, que é o armazém dessa vez. Isso é, provavelmente, o que o culpado queria.
Mas o culpado com certeza está subestimando.
A memória da Kunagisa Tomo.
“Uni. Uni uni. Mas sabe-, se o culpado queria destruir as imagens da cena do crime da Kanami-san, o que será que tinha de incoveniente-? Será que tinha alguma prova crucial? Mas, não tem nada assim na memória da Bokusama-chan…”
Dentro da cabeça da Kunagisa, não só a cena do crime de ontem, mas assim como o aspecto do armazém, isso sim está gravado com uma precisão tão boa quanto a de uma câmera digital. A Kunagisa Tomo não era chamada de Savant quando criança por qualquer razão.
“Tem alguma coisa que te incomoda?”
“Un. Como posso dizer, tem muita coisa que me incomoda. Agora, estou tentando diminuí-las. Deixa eu ver… É mesmo…”
A Kunagisa começou a sussurrar. Quando ela fica desse jeito é melhor não atrapalhá-la. Eu voltei a olhar na direção da Hikari-san.
“Onde será que é bom enterrarmos, Hikari-san?”
“Deve ser melhor que não seja ao lado da Ibuki-san, não é…”
Concordo completamente.
Depois de andarmos um pouco pela montanha, encontramos um lugar ideal para enterrar uma pessoa e decidimos cavar um buraco ali. Ontem, no caso da Kanami-san tinha dois homens, mas agora só tem eu e por isso até que foi uma tarefa bem árdua. Na verdade, eu queria que o Shinya-san também ajudasse, mas infelizmente ele está em outro time. Fora isso, não é fácil para pessoas com uma sensibilidade normal enterrar por dois dias seguidos rostos conhecidos.
Desde que não seja alguém como eu.
Se bem que isso quer dizer que eu sou inferior.
“… Assim deve estar bom.”
Eu arrumo meu cabelo. Se fosse verão agora, eu estaria encharcado de suor. Saí do buraco e coloquei o corpo da Akane-san. E depois, fiquei um pouco em silêncio. Se essa ação tinha algum significado eu não sei, mas achei que era melhor fazer isso.
<Eu, Sonoyama Akane, não importa quando, onde, por quem, de que forma, por quaisquer razões pela qual eu seja morta, não pretendo reclamar>.
O que eu ouvi, essas foram as últimas palavras da Akane-san. Mas, será que era assim mesmo? Agora que a Akane-san foi morta, será que ela foi mesmo para o mundo do outro lado como uma sábia, uma santa, sem nenhuma reclamação?
Isso é…, impossível para mim.
“Realmente gostaria de enterrar a cabeça junto”, e disse a Hikari-san. “Foi assim com a Ibuki-san também, mas o que o culpado cortou o pescoço?” “Uma pergunta que já foi repetida várias vezes. Claro que a resposta também vai se repetir.”
Isso quer dizer, <não sei>.
Eu peguei a terra com a pá e comecei a enterrar o corpo da Akane-san. Amanhã vou estar com certeza com dor muscular. Não, isso só acontecerá se a sensibilidade do meu cérebro de sentir dor ainda estiver funcionando. Não é impossível que eu não possa ser a possa vítima. A possibilidade não é alta, mas também não é tão baixa a ponto de ser impossível.
Assassinato em série.
Pode ser que, agora que a Kanami-san e a Akane-san foram mortas, isso tenha acabado. De acordo com a informação do amigo da Kunagisa, o Chii-kun, as duas tinham alguma relação, não sei o que é, mas as duas possuíam algum tipo de relação e pode ser que haja a possibilidade do incidente já ter terminado. Mas, não dá para negar que esse é um pensamento bem positivo.
E então, terminei de enterrar completamente a Akane-san.
“Hikari-san. Aproveitando que já estamos aqui fora, será que não tem como nos levar até onde é possível ver aquela janela do lado de fora?”
“Sim, entendi.”
A Hikari-san começou a andar.
A Kunagisa segue logo atrás dela. O cabelo azul treme. Por falar nisso, hoje ainda não amarrei nenhuma vez o cabelo dela. Pensei em fazer isso quando voltarmos ao quarto.
No meio do caminho, a Hikari-san olhou para mim e com um rosto sério me agradeceu “Muito obrigado”. Eu fiquei assustado por não saber sobre o que isso se tratava.
“No café da manhã, você me protegeu, não foi? É um agradecimento em relação a isso.”
“Ah…, não é como se eu tivesse protegido a Hikari-san. Só não gosto de ficar repetindo o mesmo erro. Mesmo que não seja um erro, assim, eu não gosto de ficar repetindo as coisas.”
Será que é por isso que tenho memória ruim?
“Principalmente em situações como essa.”
“Nyahaha, é mesmo algo que o Ii-chan faria”, a Kunagisa sorri inocentemente. “Mas sabe-, porque era a Hikari-chan que decidiu proteger, não é? A Hikari-chan está bem no meio do strike zone do Ii-chan, né?”
“O que é, esse meu strike zone?”
“É mais velha-, é uma garota-, é baixa-, cabelos longos, magra-, não usa anel e também usa avental.”
“O último não é.”
“Ou não usa nenhuma roupa de cima e usa jeans, ou é como uma bibliotecária-san que usa um avental branco e óculos, ou é uma garota que parece uma yankee e é um pouco mais alta e tem cabelo tingido de castanho e usa um colete-“
“Não fique espalhando meu gosto maníaco.”
Realmente. Ela tem uma boca leve mesmo.
Mas que a Hikari-san é do meu tipo é verdade. Em questão de velocidade seria a personalidade da Akari-san, que é um pouco mais agressiva que faz meu tipo, mas a Hikari-san que é gentil, uma slow ball, também não seria ruim. A Teruko-san seria uma bola demoníaca que some.
Não, isso não faz sentido.
“Hah…”, a Hikari-san mostra um sorriso meio vago como se ela estivesse meio envergonhada, meio incomodada. “De qualquer jeito, queria agradecer. Assim… A ojou-sama nesse sentido é bem severa… E dessa vez ao contrário do caso da Sonoyama-san, só consigo pensar no fato de que só eu seria capaz de realizar o crime. Eu mesma acho isso. No caso da Sonoyama-san, havia a idéia de que <por ser um quarto fechado ninguém poderia ter feito>. Mas dessa vez…”
“Isso já não importa mais, Hikari-san”, eu estava achando aquilo meio cansativo e por isso acabei interrompendo a frase da Hikari-san. “A Hikari-san foi educada comigo. Foi sincera e confiou em mim. Por isso não precisa ficar me agradecendo por qualquer coisa.”
“Mas…”
“Se os nossos lugares estivessem invertidos, a Hikari-san não me deixaria naquela situação também, certo? Nessa hora a Hikari-san também iria me ajudar.”
“Mas nessa hora você também vai me agradecer.”
Hmm, veio assim.
A Hikari-san até que é teimosa.
“Assim, a Hikari-chan já não é nossa amiga”, e a Kunagisa disse. “Nós não duvidamos dos nossos amigos. Por isso pra Bokusama-chan, o Ii-chan e a Hikari-chan não podem ser os culpados.”
“Amiga…”, e a Hikari-san assentiu demonstrando profundas emoções. “Eu até agora nunca tive amigos. Desde que eu posso me lembrar, sempre estive junto com a ojou-sama…”
“Bokusama-chan também não tem amigos. O Ii-chan também. Por isso Bokusama-chan ficaria feliz se a Hikari-chan se tornasse nossa amiga.”
Depois de falar isso a Kunagisa, segurou as mãos da Hikari-san.
Isso é provavelmente, para quem está vendo, uma visão agradável. Mas, pensando realisticamente eu achei que para a Hikari-san e a Kunagisa continuarem sendo amigas seria muito difícil. A Hikari-san vai continuar aqui tendo que morar ao lado da Iria-san, enquanto que a Kunagisa é uma pessoa que tem um lugar para voltar lá. E do lado de lá a Kunagisa só vai ficar trancada na sua casa.
A Kunagisa Tomo é solitária.
Dizem por aí desde a antiguidade que os gênios se completam sozinhos e nesse sentido, isso cabe muito bem para a Kunagisa Tomo. Mesmo que essa não seja a única condição.
E provavelmente,
Eu, que só consigo ver essa visão dessa forma,
Sou o mais solitário.
“Ah, é ali. Essa janela.”
Depois da Hikari-san falar isso, eu fiquei por um momento confuso. Isso porque uma janela do tipo não apareceu no meu campo de visão.
“… Por acaso é essa aqui?”
Eu, apontei para uma—única janela que se pode ver é essa—janela que estava na altura do meu peito e disse.
“Sim.”
“Mas, nessa posição baixa—“
“Por dentro está em uma posição alta, mas como metade dessa região está coberta pela montanha, fica assim.”
Enquanto ouvia a voz da Hikari-san eu olhei para dentro da janela. Deu para ver uma pequena poça de sangue, uma mesa de madeira, uma cadeira e a porta meio aberta pelo lado de dentro. É, sem sombra de dúvidas, o armazém que eu dormia, no qual a Akane-san foi morta.
Faz sentido. Uma parte da mansão está coberta pela montanha e o armazém é uma dessas partes.
“Assim, não parece muito difícil invadir pelo lado de fora.”
“Mas, não tem como abrir essa janela por esse lado. Não tem alguma trava e não é como se ela fosse abrir se você a balançasse.”
“Então, como uma das possibilidades a Akane-chan abriu a janela por conta própria e chamou o culpado pra dentro?”, e disse a Kunagisa. “Bate na janela e espera que ela seja aberta. Como perguntar se tem alguém aí-?.”
“Eu não acho que aquela pessoa faria algo como convidar o culpado… Era aquela Akane-san, viu? E, além disso, até que é alto mesmo. Vendo daqui de cima, dá para sentir bem melhor. Pelo menos eu, não tenho a coragem de pular daqui.”
A janela é do tipo que se abre inclinadamente e por isso não tem como se arrumar para pular. Se aterrissar de qualquer maneira, é fácil quebrar algum osso e se bater a cabeça é até possível que se morra levando em conta essa altura.
“Supondo que a Akane-san tenha convidado o culpado, caso ele tenha tentado matar a Akane-san, ela poderia facilmente ter chamado ajuda. Já que o telefone de linha interna está logo ali do lado.”
“Ela pode ter sido atacada quando estava dormindo—ah, que grande erro da Bokusama-chan. Se estivesse dormindo não teria como convidar o culpado.”
“Mesmo que se desconsiderem esses detalhes, o problema agora seria como sair do quarto. Mesmo um profissional de escalada, não conseguiria subir por essa parede lisa.”
“Vai que era uma lagartixa. Nihaha”, a Kunagisa coloca a cabeça dela na janela e confirma a situação no interior. “Hmm. É perigoso mesmo. Ii-chan, se usar uma corda como fica?”
“Uma corda, né. Mas aqui perto não tem uma árvore para amarrá-la.”
Eu olho ao redor. Se foi desmatado ou se já era um lugar assim, eu não sei, mas por perto não tem nenhuma planta, nenhuma árvore na qual uma corda pudesse ser amarrada. Claro que também não achei nada que pudesse substituí-las.
“E sabe, rapel não é algo tão simples assim. Eu sei porque tenho experiência, mas aquilo é bem complicado. A pele da mão logo descasca, então dá para saber.”
“É só usar alguma luva.”
“Isso é. Mas como possibilidade ainda acho meio baixa. Se for assim, acho mais provável ter colocado uma escada pela janela.”
“Mas por esse espaço, não entra uma escada. No meio fica travada e se ficar travada não dá para entrar.”
“Hmm. Será mesmo…, Hikari-san, nessa ilha tem alguma escada?”
“Não tem…”
“Tem a possibilidade de que alguém trouxe?”
“Também não acredito que seja possível. Se tivesse uma mala tão grande, daria para perceber.”
“Então, uma escada de corda. Se for uma dessas, dá para arrumá-la para ocupar pouco espaço e também é possível colocá-la pela janela.”
“Ii-chan, já perdeu as memórias sobre o que você disse? No caso de uma corda, não tem lugar pra amarrar. Pode ter prendido a escada com algum objeto metálico, mas se fosse assim iria ficar alguma marca na parede. Pelo que dá pra ver a parede está bem limpinha.”
Isso mesmo. Claro que isso não é algo que precise ser falado, é só pensar um pouco que se chega a essa conclusão. Mas no sentido de querer confirmar a verdade é melhor mesmo falar. Será que isso também é um tipo de harmonia pré-estabelecida?
Eu olhei para a direção da Hikari-san, “Tem alguma idéia?”, e perguntei.
“Pode ser algo que tenha percebido também.”
“Não, tem nada…”, a Hikari-san respondeu enquanto se aproximava da janela. “Mas se for supor que o culpado não entrou pela porta, só dá para pensar que ele invadiu pela janela…”
“Invadir… Não, pode ser que não seja preciso fazer isso”, eu falei a primeira idéia que veio a minha mente. “Se a cadeira estava ali, isso quer dizer que a Akane-san estava sentada lá, lendo algum livro. “Se fizer um laço como o de cowboy e colocar pela janela… Dá pra prender a pescoço da Akane-san e erguer. Ela vai morrer asfixiada. Ergue até a janela. Ali corta o pescoço. Será que não dá?”
Será que não é possível? Não, pelo menos não tem nenhum paradoxo. Assim, dá para criar aquela situação sem entrar pela janela, sem entrar no quarto.
Se tiver alguma discrepância seria— “Não…, é impossível.”
“… Por quê? Achei que não era uma idéia tão ruim assim”, a Hikari-san disse isso como se estivesse achando isso estranho. “Se for assim, qualquer um poderia ter feito…”
“É porque o corpo de uma pessoa não é tão leve assim.”
A Akane-san não era uma mulher de baixa estatura. Ela até que era alta e por cima, tinha uns 50 quilos. Mesmo que não chegue a 60 quilos, é pelo menos mais que 40 quilos. Para puxar isso dessa posição seria necessário uma corda resistente e muita força nos braços. Ao menos isso é impossível para mim. Erguer o corpo de uma pessoa até essa altura.
“Quem tem mais força deve ser mesmo o Shinya-san… Só que ele tem um álibi. E mesmo que ele tenha mais força, não acho que seja possível que ele consiga fazer isso sozinho. Afinal a Akane-san também deve reagir.”
E se isso acontecer, o telefone de linha interna está logo ao lado. Nem que ela só tivesse dado um chute nele, alguém saberia sobre o crime. Pelo menos essa não é uma maneira inteligente de se fazer as coisas.
“E sabe, pra isso acontecer a janela tem que estar aberta. A Akane-chan tem que abrir a janela e além disso tem que ficar de costas para ela, será que isso é possível? A Akane-chan não é idiota, ou melhor, ela é inteligente, então ela vai tomar cuidado.”
É mesmo.
Merda. Tinha achado que tinha se aproximado um pouco da verdade, mas não deu. É como uma sensação ruim de como se as dimensões estivessem sendo distorcidas. É como se estivessem perguntando para mim qual é a soma dos ângulos internos de um círculo. Tem algo muito errado. Tem algum erro grosseiro. Onde eu estou errando?
È como se, eu estivesse sendo colocado para dançar.
“… De qualquer jeito, vamos voltar para o quarto. Ficar aqui acho que não ajudar mais nada.”
Muito que voltar ao quarto vai ajudar em alguma coisa.
A Kunagisa estava olhando para o lado de dentro da janela como se estivesse arrependida de alguma coisa, até que começou a me seguir.
“… Aconteceu alguma coisa?”
“Não. Mais do que isso, Ii-chan. Bokusama-chan tá com fome.”
“É…”
Então o que acha de almoçarmos, e disse a Hikari-san.
É mesmo, e eu assenti.
1 - Hayon = Ohayou = Bom dia.
2 - Lendo isso (em japonês) tem a mesma entonação que joke (piada). Mais um jogo de palavras do Nishio Ishin.