Zaregoto portugues:Volume 2 Capítulo 1

From Baka-Tsuki
Jump to navigation Jump to search
Zerozaki Hitoshiki - O Assassino.


0

Meu mundo é o mais legal.

1

A Universidade Privada Rokumeikan, localizada em Kinugasa, cidade de Kita em Kyoto, possui um total de três refeitórios. Das três, o refeitório Zonshinkan Chika (carinhosamente abreviado para "Zonchi") era conhecido como o mais vívido. Provavelmente porque tinha um cardápio extenso e ao lado havia uma livraria.

Naquele dia, já que eu não teria aula durante o segundo período, fui direto ao Zonshinkan Chika depois do primeiro período. Eu não tinha tomado café da manhã, pois acidentalmente dormi uma hora a mais, então pensei em almoçar mais cedo.

"Cara, está vazio nessa hora. Negócio arriscado", resmunguei para mim mesmo, duvidando a todo momento se eu estava usando a frase "negócio arriscado" corretamente. Peguei uma bandeja.

Agora, o que deveria comer?

Eu não sou uma pessoa que ama comer, então normalmente apenas como qualquer coisa. Seja doce ou picante, tanto faz. Mas ultimamente as coisas foram um pouco diferentes.

Apenas um mês atrás, passei uma semana em um lugar que era servido três refeições gourmet por dia. Agora, como uma consequência, minha língua ainda estava acostumada com estes sabores. Esse mês inteiro nada me fez falar "Wow, isso é bom." Toda vez que eu comia alguma coisa, sempre sentia que algo estava faltando, algo como um ingrediente essencial.

Não era um problema que merecia ser chamado de problema, mas eu já estava cansado disso. Pensei em duas soluções.

A primeira era extremamente simplesː Apenas comer comidas deliciosas.

"Isso não pode acontecer em um refeitório escolar."

Esta primeira sugestão era impossível de seguir, sem retornar a aquela estranha, isolada ilha. Não direi que sou totalmente contra esta ideia, mas certamente tenho minhas restrições.

"Então isso não funcionaria."

Sim, eu estava falando sozinho.

A outra medida possível era usar a força. Era a tática de "bater na criança que não escuta". A maioria dos problemas do mundo são resolvidos dando ou tomando.

Fui até a cantina de Donburi[1] e fiz meu pedido.

"Com licença, uma grande porção de Kimchi[2], por favor. Sem arroz."

A cozinheira fez uma expressão zombeteira e disse, "Isso é apenas kimchi, filho.", mas ela fez o prato do mesmo jeito. Como se não fosse nada, ela jogou-o na minha frente, mostrando um admirável profissionalismo.

Uma grande montanha de kimchi empilhada. Eu duvido que exista apenas uma pessoa no mundo forte o suficiente para mastigar tudo isso e ainda manter seu paladar. Eu concordei com satisfação, coloquei a tigela na minha bandeja, e paguei a conta.

O refeitório estava tão vazio que era difícil escolher onde sentar. Na próxima hora, o lugar estaria cheio de estudantes que saíram do segundo período mais cedo. Eu nunca fui um fã de multidões, então me coloquei sob um tempo limite. Escolhi um lugar no canto.

"Vamos lá", eu murmurei, e dei a primeira mordida...

Isto. Foi. Horrível.

Eu realmente tinha que comer tudo isto? Não era isto que era comumente conhecido como comportamento suicida? Que destino cruel me levou a isso? O que foi que eu fiz?

"Isso é uma retribuição divina?"

Eu acho que eles também falam, você colhe o que você planta.

Eu segurei meus hashis em silencio. Se eu continuasse a falar comigo mesmo, os outros achariam que eu era estranho. Além disso, é falta de educação falar enquanto está comendo.

E então, eu atingi meu limite. Minha cabeça inteira estava dormente, da ponta da minha língua para cima. Eu não sabia o que eu estava fazendo, ou então, quem eu era, ou o que a palavra quem significava, e até o que a palavra "significava" significava...

"Yo."

Ela sentou na cadeira da minha frente.

"Puxe essa bandeja um pouco, por favor." ela disse. Então ela empurrou minha bandeja em minha direção e colocou a dela no espaço recentemente aberto. Ela continha um espaguete à carbonara, uma salada de atum com alga marinha, e uma sobremesa de frutas bônus para um total de três pratos.

Oh, que burguesa.

Eu olhei para minha direita, depois para a esquerda. O refeitório estava vazio. Você poderia chama-lo de deserto. Então por que ela decidiu comer seu espaguete na minha frente? Provavelmente era algum tipo de desafio.

"Meu Deus, o que é isso?ǃ É tudo kimchiǃ", ela exclamou tendo uma chocante visão do meu almoço. "Wowǃ Você está comendo uma tigela inteira de kimchiǃ".


Ela estava com seus olhos arregalados, e com suas mãos no ar fazendo um gesto como um "U". Talvez fosse o que ela estava fazendo, ou quem sabe ela estava se rendendo. Também havia a possibilidade dela ser muçulmana. Qualquer uma que fosse por mim tudo bem, mas na verdade, ela estava provavelmente apenas surpresa.

Seu cabelo na altura do ombro possuía um tom avermelhado e era algo como um bob.[3] Suas roupas não eram nada fora do comum. Elas eram ultra-simples, seguindo o estilo do corpo estudantil da Rokumeikan. De repente, quando se sentou, ela parecia muito mais baixa. Logo percebi que grande parte de sua altura vinha de suas altas botas london style.

Ela parecia jovem, então não consegui dizer se era mais velha ou do mesmo ano. Julgando apenas pelo seu comportamento, seria plausível ela ser mais nova, exceto que eu era um novato, logo isso era impossível.

"Hey. Sabe, se você não responder, me sentirei sozinha e coisas do tipo." Ela me encarou com olhos de cachorrinho.

"Certo," Eu finalmente disse. "Quem é você?"

Eu tinha quase certeza que era nosso primeiro encontro. Porém eu aprendi uma coisa mês passadoː Este pequeno e estranho espaço conhecido como "universidade" tinha um grande número de pessoas que eram amigáveis e genuínas. Essas pessoas estranhas conversavam como se você fosse seu melhor amigo por dez anos, mesmo que você nunca as viu antes. Para um cara como eu, que não lembrava de encontros pessoais, isso tornava as coisas difíceis algumas vezes.

E com certeza essa garota era algo desse tipo. Com medo de ter que lidar com a chatice de um convite para um clube, ou pior, algo religioso, eu perguntei aquilo.

Ela fez uma pose exagerada como se estivesse chocada. "Hwa?ǃ" Ela disse. "Meu Deusǃ Você esqueceu? Você me diz que esqueceu? Você realmente esqueceu?ǃ Ikkun, isso é muito frioǃ"

Huh.

Julgando pela reação, parecia não ser o nosso primeiro encontro.

"Ohhh. Eu estou chocada. Mas o que você pode fazer, certo? Sim, nada. Você só tem um memória ruim, certo? Bem, devo me apresentar de novo." Ela estendeu ambas as mãos e deu um sorriso de ponta a ponta. "Meu nome é Aoii Mikokoǃ"

Isso acabou de provar que talvez será um encontro doloroso.

Mesmo se fosse o primeiro encontro ou não, essa era, com certeza, minha primeira impressão da Aoii Mikoko.

2

A história dela era simples. Mikoko-chan e eu éramos colegas de classe. Nós não estávamos apenas tendo as mesmas matérias principais, mas também estávamos na mesma classe de língua estrangeira. Já tínhamos conversado cara a cara algumas vezes, e ficamos no mesmo grupo no campo de treino antes da Golden Week[4]. Ficamos até em pares em uma aula de Inglês.

"Cara... depois dessa conversa, eu devo parecer um louco por não lembrar de você."

"Eu acho que você é um louco totalǃ" Ela riu contente. Para ser capaz de rir tão alegremente depois de alguém ter esquecido completamente de sua existência levou a um certo tipo de situação vaga. Pensei que ela era provavelmente uma garota legal depois de tudo.

"Normalmente, eu acharia meio perturbador você me esquecer assim. Ou melhor, eu ficaria brava. Mas isso é apenas como você é, certo? Assim, você não esquece das coisas realmente importantes, apenas das mais comuns." ela disse.

"Bem, não posso argumentar com isto."

Ela estava completamente certa. Uma vez, eu esqueci se eu era destro ou canhoto, e me encontrei em um problema quando sentei para ter uma refeição. Depois que tudo foi dito e feito, descobri que era ambidestro.

"Ok, e o que está acontecendo?" eu perguntei. "Por você não está na sala?"

"Sala? Bem, o negócio é..."

Por alguma razão, ela parecia extremamente feliz. Eu tenho uma sensação que esse "anormalmente feliz" era sua natureza padrão. Sendo honesto, mesmo que já havia falado com ela, eu ainda não consigo lembrar de como ela era normalmente. De qualquer maneira, era difícil de ser enrolado por essa menina sorridente.

"Eu estou matando aula."

"Novatos deveriam presenciar as aulas." eu disse.

"Ah, qual foi, é chato. Totalmente chato. O que era mesmo? Ah, sim, minha aula de economia. É apenas uma montanha de gírias. E é como uma aula de matemática. Eu sou uma pessoa de ciências humanasǃ E você também não está na salaǃ"

"Eu não tenho nada agora."

"Serio?"

"Sim. Todas as Sextas, eu só tenho o primeiro e o quinto período."

Ela balançou suas mãos selvagemente de novo. "Isso não é meio chato? São seis horas de tédio."

"Tédio não é necessariamente algo ruim."

"Hm, eu pensei que tédio era praticamente a definição de ‘uma coisa ruim.’ Pontos de vistas diferentes, eu acho." Ela começou a rodar o garfo no espaguete enquanto falava. Fracassando em enrola-lo no utensílio, isso rapidamente se tornou uma situação de tentativa e erro. Reconheci que demoraria um tempo até a comida chegar em sua boca. Antes de eu perceber, ela guardou o garfo e trocou por hashis. Tanta determinação.

"Diga..." eu falei.

"Hm? O que, O que?"

"Há muitos lugares vazios."

"É, realmente. Eu acho que o lugar vai encher daqui a pouco, entretanto." ela disse.

"Mas está vazio agora, certo?"

"Assim como você disse. Alguma coisa errada?"

"Eu quero comer sozinho, então vamos saindo, docinho." era o que eu gostaria de ter falado. Mas então eu vi seu sorriso, um sorriso vulnerável mostrando que ela sequer imaginou que estava prestes a ser rejeitada, mesmo eu tive pena.

"Nah... Não é nada."

"Hm? Você é um cara estranho." Ela disse de repente. "Ah, mas eu acho que se você não fosse assim, não seria você. Esquisitice é algo como sua identidade, certo?

Não pude evitar, mas senti que estava sendo insultado. Contudo, não era tão mau quanto esquecer de alguém que você teve contato regular por um mês inteiro. Então eu ignorei tudo isso e voltei meu foco para meu kimchi.

"Ikkun, você é um fã de kimchi?"

"Nah, não muito."

"Mas isto é muito kimchi. Nem coreanos comem tudo isso de uma vez só."

"Bem, eu tenho minhas razões." falei enquanto colocava um pouco de kimchi em minha boca. Mais da metade ainda estava na tigela. "Não são muito interessantes, mesmo assim."

"Razões?"

"Tente descobrir primeiro."

"Huh? Oh, certo... ok." Mikoko-chan cruzou seus braços e começou a comtemplar minha lógica. Claro, descobrir quais circunstancias me levaram a comer uma tigela inteira de kimchi não era exatamente fácil. Depois de alguns momentos de reflexão, ela deixou seus braços cairem apaticamente. Ela realmente foi rápida em jogar a toalha.

"Oh, sim, eu tenho um pergunta para você. Eu pensei que seria uma boa oportunidade. Posso?"

"Uh, com certeza."

A frase "uma boa oportunidade" não era normalmente usada para expressar algo que apareceu por chance? Pelo que eu saiba, Mikoko-chan veio aqui e sentou na minha frente pela sua própria vontade.

Ou talvez isso era irrelevante.

Ela estava com o mesmo sorriso quando fez a pergunta. "Ikkun, você não veio para a escola no começo de Abril, por quê?

"Uh..." Meus hashis pararam de mover. Os pedaços de kimchi que eles seguravam caíram de volta na tigela. "Uh, bem..."

Eu deveria estar com um semblante incomodado, porque Mikoko-chan rapidamente começou a mover suas mãos freneticamente e dizer, "Oh, se é difícil de falar sobre isso, não se preocupe. Eu só estava curiosa, isso é tudo. É como, Mistérios sem solução estrelando Mikoko-chan."

"Não, não é difícil de falar sobre. É uma história simples, realmente. Eu estava apenas viajando. Por uma semana."

"Viajando?" Ela piscou para mim como um animalzinho selvagem. Suas expressões era fáceis de ler. Era simples falar com ela, ela era uma boa ouvinte.

"Viagem? Para onde você foi?" Ela perguntou de novo.

"Para uma ilha deserta no Mar do Japão, meio que por acidente."

"Por acidente?"

"Sim. Um grande acidente. De qualquer jeito, esse é o motivo de eu estar comendo kimchi."

"Ela coçou sua cabeça, o que provavelmente era uma reação natural. Mas sou fundamentalmente uma pessoa preguiçosa, logo não queria explicar todos os detalhes. Ou melhor, como eu poderia?

"De qualquer forma, apenas uma viagem,nada algo muito elaborado."

"Huh. Não diga."

"O que você achou que era?"

"Oh, nada..." Ela corou um pouco. "Apenas pensei que talvez, uh, você se machucou de alguma maneira e teve uma estadia prolongada ou algo do tipo."

Como e por que ela pensou nessa ideia era um mistério para mim, porém, para alguém de repente faltar uma semana depois de entrar numa universidade, não havia muitas outras possibilidades. Pelo menos, era uma explicação melhor que "Eu estava apenas em uma viagem."

"Entendo, algo como uma viagem de graduação atrasada."

"Sim, algo como isso. Não consegui reservar, então ficou para Abril." Eu disse encolhendo os ombros, mas a realidade era totalmente diferente. A ideia de "graduar da escola" era algo que não experimentei desde o ensino fundamental. Certamente nunca fui em uma "viagem de graduação". Explicar o que realmente havia acontecido seria extremamente longo e desnecessário, logo só segui a interpretação dela.

"Hmm..." Ela fez uma expressão meio convencida. "Você foi sozinho?"

"Sim."

"Entendido." E então, apenas com isso, o sorriso alegre voltou. Toda a confusão foi esclarecida. Ela definitivamente não colocava nenhuma fachada. Ela era tão direta com suas emoções que quase me deixava com inveja.

Bem...

Nem tanto.

"Mikoko-chan... Por que você está aqui?"

"Huh?"

"Você tem alguma coisa para falar, eu assumo? Digo, considerando que sentou nessa mesa, enquanto tem uma sala cheia de cadeiras vazias."

"Huh." Ela estreitou seus olhos e abaixou-os um pouco, olhando para meu peito. "Só posso sentar com você se tiver algo para falar?"

"Huh?" Agora era minha vez de coçar minha cabeça.

Ela continuou a falar. "Quero dizer... Estou te incomodando? Eu te vi quando estava andando por aí, então pensei que poderíamos comer juntos."

"Ah, entendo."

Ela só queria uma companhia para comer junto. Sou do tipo que prefere fazer coisas pessoais, como comer, sozinho, contudo existem muitas pessoas que veem o tempo para comer e o tempo para conversar como a mesma coisa. Mikoko-chan com certeza era uma delas. Inesperadamente decidindo matar aula, ela não achou nenhum amigo para lhe fazer companhia, então veio falar com o primeiro conhecido que viu, eu.

"Bom, se isso é tudo, por mim tudo bem." Eu confirmei para ela.

"Obrigada. Isso é um alívio. Não saberia o que fazer se você tivesse dito não.

"Não saberia?"

"Hm? Sim. Talvez algo como isto." Ela disse, fingindo segurar as pontas da sua bandeja e girando seus pulsos num movimento brusco. "Como isso."

"Entendo..." Mesmo que ela estivesse brincando, eu estava aliviado por não ter recusado. Não conseguiria ter uma reação para isto. Alguém que expressa felicidade tão livremente pode expressar fúria do mesmo jeito.

"Eu estou livre de qualquer maneira. Enquanto você quiser apenas conversar, tudo bem." Eu disse.

"Obrigada."

"Do que estávamos falando mesmo?"

"Oh, umm..."

Quando eu fiz esta pergunta, ela começou a ansiosamente raspar seus hashis. Provavelmente pensando em um tópico.

Posso ter esquecido quem ela era, mas neste mês, ela definitivamente conseguiu compreender, pelo menos, a superfície da minha personalidade. Com qual tipo de tópico ela iria me abordar? Eu, que era tão ignorante, e não possuía um pingo de senso comum, tanto que cheguei a pensar que futebol era beisebol jogado com os pés? Eu estava estranhamente interessado, como se estivesse assistindo isso acontecer com outra pessoa.

Ela bateu uma palma como se tivesse pensado em algo. "Não acha que que o mundo ficou louco?"

"Huh? Em que sentido?"

"Quero dizer... er, você sabe, o predador, até você deve ter escutado sobre ele em algum lugar."

Até eu.

Até eu, a frase era extremamente enfurecedora. Exceto que eu não tinha ideia quem "o predador" era. "Não fale comigo como se eu fosse um idiotaǃ Claro que eu seiǃ" Uma fúria incontrolada como esta poderia ser justificada, mas "Cale a bocaǃ Como eu deveria saber quem ele é, estúpida?ǃ" não tinha a mesma validade.

"Hm? O que está errado, Ikkun?"

"Ah, nada. O que é ‘o predador’?"

Obviamente eu não estava procurando a definição do dicionário, aquele que caça. Ela ficou boquiaberta.

"Você está brincando, certo? É uma piada? Ikkun, está em todos os jornais. Não é possível ter perdido isto se você vive em Kyoto."

"Não tenho uma TV, nem compro jornais."

"E Internet?"

"Oh, eu não tenho um computador. Nem uso os daqui.

"Meu Deus, Ikkun é um homem das cavernasǃ" ela disse, parecendo impressionada. "É algum tipo de politica ou ética?"

"Talvez seja, de certo modo. Como eu explico... Não gosto de ter posses."

"Legaaaaalǃ Você soa como um filósofo antigoǃ Wowǃ" Ela bateu palmas com alegria. Eu seriamente duvidei que ela teria a mesma reação se soubesse que era, na verdade, uma pratica, e completamente chata, razãoː Meu quarto era apenas muito pequeno.

Quero dizer, jornais ocupam muito espaço.

"Quando você diz ‘se você vive em Kyoto.’, isso significa que esta coisa de ‘predador’ está acontecendo por aqui?"

"Sim, exato. Fez muito escândalo. ‘Panico na Velha Capitalǃ’ Alguns lugares até cancelaram as viagens de campo.

"Wow... que pena."

"Seis pessoas foram assassinadasǃ E ainda está ocorrendoǃ Não há nenhum suspeitoǃ" Ela estava meio irritada, e possuía uma vaga sensação de excitação em sua voz." Ele esfaqueia e espalha as entranhas da vítima por todos os lugares e coisa do tipoǃ Esquisito, huh?"

"..."

Vamos ignorar o fato que estávamos comendo. Depois de tudo, eu era parcialmente responsável pela conversa ter tomado este rumo. Mas o que dizer desta garota que conseguia discutir sobre a morte dos outros com tal alegria absoluta.

É assustador o quanto as pessoas podem se tornar desapegadas.

"Seis pessoas, huh? É muito?"

"Sim, é muitoǃ É realmente bastanteǃ Ela soou meio arrogante, como se ela fosse a assassina. "Não nos outros lugares, mas assassinatos em série são raros no Japãoǃ Isso ficou bem famoso, sabia."

"Huh. Então esse é o motivo de ter viaturas em todos os lugares.

"Sim. Há membros da força policial em Shinkyogoku. Me lembra do Festival de Gion.[5]" Por alguma razão, ela riu para si.

"Wow, vai entender. Eu não sabia de nada disso."

Enquanto eu concordava com a explicação dela, de alguma maneira eu sabia que a Kunagisa iria se divertir muito com isso. Kunagisa, para aqueles novos nesta história, é como eu chamo Kunagisa Tomo, uma de meus poucos amigos. Ou melhor, minha única amiga. Kunagisa Tomo era uma engenheira mecânica e eletrônica profissional de dezenove anos reclusa, com um cabelo azul e um interesse apaixonado em coletar informações sobre estes tipos de incidentes.

Diferente de mim, ela não estava constantemente no escuro sobre o que estava acontecendo no mundo. Ela era essencialmente um especialista em recolher informação, e provavelmente já estava ciente deste caso do predador sem eu ter que falar sobre ele. De fato, ela já deve estar tomando providencias neste momento.

"Quando isso começou?"

"Por volta do começo de Maio, talvez? Eu acho que é isso. Por que?

"Oh, só estava perguntando."

Coloquei o ultimo pedaço de kimchi em minha boca. Minha língua, ou melhor, minha boca inteira estava mutilada. Nunca mais iria desvalorizar comida ou dizer "isso está péssimo" de novo. Se você pensar sobre isto, o fato que apenas uma porção de kimchi poderia tão facilmente destruir meus princípios não dizia muito sobre meu paladar. Ou talvez fosse um problema no estômago.

"Bem, acabei. Te vejo de novo." Coloco meus hashis no prato e começo a levantar.

"Ahǃ Espereǃ Espere, por favor?ǃ Onde você está indo?ǃ" Mikoko tumultuou a fim de me parar. "Espere um minuto, Ikkunǃ"

"O que você quer dizer com ‘Onde eu estou indo’? Eu acabei de comer, então pensei em passar na livraria."

"Eu ainda não acabeiǃ" Olhei para sua bandeja. Realmente, mais da metade da comida ainda estava lá.

"Mas eu já."

"Não me deixe triste. Fique comigo até eu terminar."

"Por que eu deveria fazer algo sem sentido como isso?" ... era o tipo de coisa que eu não tinha coragem para falar. Sou do tipo que deixa ser levado.

"Ok. Estou livre mesmo." Não tinha nada urgente para fazer, e também não estava satisfeito.


Pensei em ter uma refeição normal. "Espere um pouco. Vou comprar alguma coisa."

Aproximei do caixa pela direção oposta (que era contra as regras) e dei uma olhada no cardápio na parede, ponderando se deveria escolher gyudon[6]. Geez, era mais caro que Yoshinoya[7]. Era melhor pedir outra coisa.

"Kimchi de novo?" a atendente me interrompeu enquanto tentava decidir.

"Sim."

Oops.

Fiquei intimidado e disse.

"Não adianta chorar pelo leite derramado." Ou era mais como uma situação que depois de ter acontecido você sabe a melhor resposta?

Algumas dúzias de segundos depois, recebi uma outra porção de kimchi empilhada (desta vez ela me deu um pouco a mais) e voltei para a mesa onde kikoko-chan estava.

"O que? Eu deveria entender alguma coisa?"

"Não se preocupe com isso. Do que estávamos falando?"

"Hm? Uh, o que era? Esqueci."

"Entendo. Certo, então quer falar sobre as aulas?"

Ela sacudiu sua cabeça firmemente.

"Por que? Há algumas coisas que não entendi no primeiro período hoje, logo pensei em estudarmos juntos. É uma aula obrigatória para novatos, portanto você foi, correto? Se me perguntar, a falta de habilidade do professor em explicar as coisas propriamente é um problema, mas o que você acha?

"O que eu acho?ǃ Acho que não há um garoto vivo que fala isto para uma garota quando não estamos perto de provasǃ"

Estava apenas brincando, contudo ela parecia realmente irritada com isso. "O que foi? Você não gosta de estudar?"

"Ninguém gosta de estudar."

"Isso soa debatível para mim. Mas se você odeia estudar, por que foi para uma universidade?"

"Ah, essa é uma pergunta proibida. Todos sabem disso. Digo... todo mundo é assim, certo?"

Parecia que eu falei algo que não deveria, e ela de repente ficou melancólica. Lembrei que alguém me disse que as universidades Japonesas não eram lugares para gente que queria estudar, e sim para ter mais tempo para se preparar antes de entrar na sociedade.

"Heh, esse é um jeito de interpretar."

"Você gosta de estudar?" ela perguntou.

Encolhi os ombros.

Claro que não.

Eu odiava.

"Mas não é ruim para passar tempo. Ou para escapar da realidade."

"Normalmente, estudar é a realidade." Ela deu um suspiro pesado. Então, mudando seu foco para sua refeição, começou a comer sua salada em silêncio.

Hmm. Comer um prato de espaguete, uma salada grande e uma sobremesa era normal para uma garota abaixo dos vinte anos? Não conseguia usar ninguém para fazer uma comparação, todos que eu conhecia eram incrivelmente mimados, ridiculosamente gulosos, ou estavam sempre de jejum ou alguma coisa, então não possuía padrões para julgar. Vendo como Mikoko-chan não era nem muito magra, nem o oposto, talvez fosse uma porção apropriada para ela.

"Umm, é difícil comer com você me encarando assim."

"Oh, desculpe."

"Tudo bem."

Ela voltou a comer. Quando estava quase acabando, começou a me olhar como se estivesse investigando minha moda. Ela estava me espiando frequentemente o tempo todo, mas de repente isso se tornou óbvio, e ela me olhava como se quisesse me falar algo.

E realmente, isso provou estar correto.

Como se estivesse decidida sobre algo, ela colocou seus hashis na mesa sem acabar sua sobremesa. Ela deu um sorriso brincalhão e inclinou seu corpo para frente, deixando seu rosto perto do meu.

"Então, Ikkun."

"Sim...?"

"A verdade é, talvez eu tenha ou não uma favor para te pedir."

"Você não tem."

"Tenho." Ela voltou para seu lugar. "Você é o tipo de cara que estará livre amanhã?"

"Se você definir livre como não ter nenhum plano, então sou mais apto a dizer sim."

"Sim, meio difícil de te entender."

"Esse é o meu jeito." Respondi e mastiguei meu kimchi. "Para deixar mais simples, sou um cara livre."

"Sério? Você estará livre? Oh, bom!" Ela pressionou suas mãos com uma verdadeira expressão alegre. Causar felicidade a alguém só por não ter planos em um sábado parecia um pouco demais.

Mais importante, isto não parecia bom. Eu tinha um sentimento distante que seria arrastado para alguma coisa.

"Entendo, entendo, se eu estou livre, é algo bom para você, huh? Uma mão lava a outra. É também um tipo de cadeia alimentar. Um circuito magnífico."

Ela não estava escutando. "Sim. De qualquer maneira, se você está livre amanhã, espero que a gente possa ir junto!"

Com suas mãos ainda juntas, ela virou-as um pouco para o lado para enfatizar seu pedido. Era uma pose tão sincera, que quase pareceu um jogo sujo. Não existe uma forma de vida masculina que não se renderia para isso. Eles gostariam de se render.

Mesmo assim, eu recusei sem misericórdia.

"Não."

"Hã?! Por que?!" ela gritou. "Você estará livre, certo?"

"Bem, sim. Mas como eu disse, não desgosto do tédio. Algumas vezes as pessoas gostam de passar o dia fazendo nada, certo? Todos sentem isso alguma vez. Querem escapar da pressa e animação do mundo, se livrar da confusão de lidar com outras pessoas. Todo mundo tem seu tempo de contemplar suas próprias vidas. Eu apenas tenho mais."

"Mas, mas, mas! Como você pode recusar sem nem me escutar?! Isso é louco! É como um bando de estudantes da oitava série formando uma banda, porém todos tocam baixo!"

Foi uma ótima analogia.

Olhando atentamente, era aparente que ela estava prestes a chorar. Lágrimas já estavam se formando no canto de seus olhos. Não era uma situação desejável.

Eu olhei para os lados. Já era hora do refeitório começar a encher, e estudantes começaram a entrar gradualmente. Neste ponto, eu queria evitar me destacar (por fazer, uma relativamente bonita, garota chorar) o máximo possível. Mas quem chora só por ter sido rejeitada?

"Ok, ok, apenas se acalme. Vou te escutar. Vamos, coma um pouco de kimchi.

"Tá." ela disse, fungando.

Fazendo como eu sugeri, Mikoko-chan colocou um pouco de kimchi em sua boca. "Uwa!" ela chiou, e lágrimas realmente começaram a cair. Parecia que ela não gostava de surpresas (o que eu já sabia).

"Ahh, quente..." ela chorou.

"Bem, é kimchi. Não seria kimchi se não fosse picante."

Dizem que existe um com açúcar, mas sempre comprei o picante, então nunca provei. Também não me importo se nunca farei.

"Ohh, você é terrível. Tão mal... Agora, do que estávamos falando?"

"Aquele assassino predador?"

"Não! Era sobre amanhã!

Bam! Ela bateu na mesa. Parecia que ela estava um pouco irritada. Talvez eu fui longe demais, refleti.

"Um, você conhece a Emoto-san?"

"Mesmo se eu conheço ou não, não lembro dela."

"Ela está na nossa classe. Seu cabelo é assim." Ela colocou seus punhos ao lado de suas orelhas, mas mesmo com esta pose, "Emoto-san" e seu estilo de cabelo ainda permaneceram longe da minha imaginação.

"Ela é uma garota bem notável. Sempre veste coisas brilhantes."

"Huh. Eu não observo muito as pessoas. Qual o nome inteiro?"

"Emoto Tomoe. O tomo de sabedoria e o e de bênção."

Nome interessante. Parecia ser possível plantar bananeira e correr de ponta-cabeça. Senti que lembrei de alguma coisa, mas não poderia responder algo como, "Oh sim, sim, conheço essa garota. Ela usa lentes de contato, certo?" Poderia ter uma chance de Mikoko-chan jogar na minha cara, "Te enganei! Não existe ninguém assim na nossa classe! Ahahaha! Nya-nya-nya!"

Eu seria enganado, e minha fraude exposta. Não que Mikoko-chan faria algo assim.

"Seu apelido é Tomo-chan."

"Isso não funcionará para mim."

"Huh? Por que não?"

"Nenhuma razão. Apenas uma coisas minha." sacudi minha cabeça. "Desculpe. Não me lembro dela."

"Era o esperado." ela disse, rindo. "Já que você não se lembrou de mim, não lembraria dela. Se você conseguisse, eu ficaria um pouco chocada."

Não entendi muito bem o que ela disse, mas contanto que minha memória fraca a evitou de se sentir terrível, não era totalmente sem valor. Entretanto, algo parecia errado com a lógica aqui.

"Bem, ok. E sobre a Atemiya-san? Atemiya Muimi-san? Chamo ela de Muimi-san."

"Outra colega de classe?"

Ela concordou. "Há também o Usami Akiharu-kun. Akiharu-kun é um cara, então você deve se lembrar dele, certo?"

"Minha memória é neutra em relação a gêneros."

"Mas você com certeza não parece feminista."

Ela soltou um grande e exagerado suspiro. Parecia que eu fiz algo errado, porém era culpa da minha memória, certo?

"De qualquer maneira, Tomo-chan, Muimi-chan, e Akiharu-kun. Vamos sair amanhã a noite para beber."

"Huh. Qual é a ocasião?"

"É o aniversário da Tomo-chan!" Por alguma razão ela soou um pouco arrogante. Era difícil de negar que ela era adorável quando estava sentada com suas mãos nos quadris, e o peito ressaltado. "Quatorze de Maio! Feliz vinte anos!"

Se ela era uma colega de classe, isso significa que ela era uma caloura. Talvez ela entrou na universidade um ano mais tarde, ou estava retornando, igual a mim. Isso não importava.

"Tenho apenas dezenove. Meu aniversário é vinte de Abril."

"Huh."

Eu não ligava.

Ela continuou. "Um, amanhã é o aniversário da Tomo-chan, então pensamos em fazer uma leve, festa casual."

"Huh. Parece um grupo muito íntimo para uma festa."

"Bem, sim. Gostamos da atmosfera barulhenta, mas ninguém queria muita gente lá, então o que você fará?"

"Ah. Logo quatro pessoas é bem apropriado, huh."

"Huh?" Ela pareceu surpresa.

"Uma quinta pessoa quebraria o balanço."

"Huh? Que?"

"Diga Oi para todos por mim. E feliz aniversário para você."

"Não é o meu aniversário! Hey, espere, não levante e saia! Você não sabe a outra metade da história ainda!"

"Eles dizem que saber é só metade da batalha."

"Não é isso que significa!"

Ela segurou minha manga quando comecei a levantar e forçou a me sentar. Mesmo que a conversa estava pela metade, eu sabia mais ou menos como ela iria prosseguir.

"Ok então. Agora você vai me pedir para ir nesta festa para beber... ou melhor, festa de aniversário. Certo?"

"Gah! Wow, isso está completamente certo." Ela levantou suas mãos devido a surpresa, porém dessa vez parecia falso. Talvez foi porque ela não colocou nenhuma fachada; ela era apenas uma má atriz. "Extraordinário, é como se você fosse uma psíquico ou algo do tipo, Ikkun."

"Não vamos falar disso. Não é um bom assunto." Eu soltei um leve suspiro. "Como chegamos a isso? Eu nem conheço essas pessoas, certo?"

"Sim, conhece. São seus colegas."

Ah, sim.

Talvez eu tivesse amnésia. Nunca fui bom em lembrar das pessoas, mas ultimamente estava ficando pior. Além desses três colegas, não havia ninguém em toda a Universidade Rokumeikan que eu tinha uma imagem clara.

Entretanto havia uma explicação melhor: era simplesmente a consequência da minha apatia com outros humanos. Não estava ligado com a minha função cerebral. Não era um defeito. Não faltava nenhuma peça essencial, também.

O motivo é que eu, desde o começo, era uma coisa quebrada.

"Poderia ser que eu esqueci, e sou, na verdade, bons amigos com essas três pessoas? Mesmo eu não esqueceria quem são meus amigos, acho."

A expressão de Mikoko-chan ficou um pouco triste. "Não acho que seja o caso," ela disse. "Você provavelmente não conversou muito com eles. Quero dizer, você sempre tem esse olhar, como se estivesse pensando muito sobre algo ou cheio de desprezo. Mesmo agora. Deixa meio difícil de se aproximar. É como uma parede em sua frente. Ou seu Campo de Terror Absoluto está funcionando e operante. E no fim, você sempre senta no meio da sala."

Queria dizer para ela me deixar sozinho. Queria falar para não me incomodar falando comigo se era assim que ela se sentia. Mas não fiz.

Terminei meu kimchi. Duas tigelas acabaram sendo muita coisa e senti meu estômago cheio. Provavelmente não comeria kimchi por um bom tempo.

"Porém você e eu somos amigos, certo?" ela perguntou.

"Somos?"

"Sim!" Ela bateu as duas mãos na mesa de novo. Parecia que ela tinha o hábito de bater em coisas próximas quando ficava emocional. Devo lembrar de ficar fora do alcance deste braços finos se eu for zombar dela. Seria melhor fazer isso pelo telefone.

Er, quero dizer, por que eu estava planejando jeitos de ridiculariza-la?

"E, então, naturalmente, eu falo com meus amigos sobre você algumas vezes, correto?"

"Eu acho."

"E então eles pensam, ‘Para um cara que sempre tem uma cara desagradável, ele parece meio legal.’ certo?"

"É possível."

"Então não seria estranho se eles quisessem ser amigos de um cara que parece legal, mesmo se ele for estranho. Sim?"

"Sim, acredito que todos tem tentações."

"É isso que estou dizendo."

"O que é?"

"Isso."

Ela me espiou com olhos cheios de esperança e anseio. Eu fingi que estava bebendo chá para escapar de seu olhar. Contudo, apenas uma xícara de chá com certeza não era o suficiente para revitalizar minha boca paralisada.

"Huh. Entendo." Eu disse.

"Entende?"

"É uma boa oportunidade e tal, então acho que passarei a noite na casa de meus pais amanhã."

"Não faça planos! Você nem foi para casa durante a Golden Week!"

Ela bateu na mesa mais uma vez. Eu estava um pouco perturbado que ela sabia o que eu estava fazendo durante a Golden Week, talvez eu contei para ela e esqueci.

"Sabe... é quase Dia das Mães."

"Isso foi semana passada! Além disso, você não é o tipo de cara que iria mostrar devoção aos pais!"

Isso foi bem severo. E mesmo que ela estivesse certa, ela acreditava que um jovem de dezessete anos que não visitaria nem seus pais seria gentil com alguém que era só um colega de classe? Talvez ela estivesse tão animada que não percebeu o que estava falando.

"Vamos, estou implorando. Já falei para eles que eu te levaria. Eu vou perder credibilidade."

"Parece que tem um mal-entendido aqui, então me deixe esclarecer as coisas. Não sou o tipo de cara que você pode ter uma conversa divertida. Dizem que eu tenho tanto vigor quanto uma nuvem de tempestade."

"Wow, isso é tão desapontador quanto ouvir sobre dois jovens autores iniciantes, em que um foi envenenado por uma hera venenosa e o outro foi comido por lagartas-de-pinheiro." Ela parecia um pouco mais sombria enquanto mordia seu lábio. "Vamos, Ikkun. Faça como um favor para mim. Sei que é egoísta, mas hey, vou pagar pelas bebidas."

"Desculpe, não bebo."

Isto era verdade.

"Por que não?"

"Uma vez eu bebi uma garrafa inteira de vodka de uma só vez." Eu não ousei contar a ela como tudo acabou depois disso, mas de qualquer maneira, eu desisti de álcool. Posso não ser um cara esperto, porém não sou tão idiota a ponto de não aprender com meus erros.

"Wow, nem Russos fazem isso." Ela estava verdadeiramente surpresa. "Vejo... Então você não bebe. Hm, e agora?"


Ela voltou a pensar. Parecia que ela tinha o conhecimento de como seria para um cara que não bebe ir a uma festa de bebidas. Talvez ela possuía senso comum até certo ponto.

Mesmo assim...

Eu não era tão sangue-frio a ponto de não sentir nada vendo essa garota sentada na minha frente, parecendo tão incomodada.

Droga...Sou arrastado para as coisas muito facilmente. Aceitar algo por pena era uma coisa. Mas ser arrastado para uma situação apenas quando por ser apresentada era totalmente deprimente.

"Ok, ok. Contanto que esteja bom se eu só ficar sentado do meio da sala.

"Hmm, acho que seria terrivelmente chato para você, mas sabe... Espere, você vai?!" ela disse.

Ela jogou seu corpo para frente. Talvez seja uma analogia rude, porém ela parecia um cachorro que teve comida jogada em sua frente. Um gato aproximaria com certa cautela, suspeitando da possibilidade de ser uma armadilha, mas Mikoko-chan estava completamente sem guarda. Ela pode ter lembrado um gato fisicamente, mas sua personalidade era mais parecida com a de um cachorro.

"Está realmente bem? Você virá mesmo?"

"Sim, está bem. Estou livre de qualquer forma."

Até eu estava um pouco chocado com a minha franqueza e pensei se não existia uma maneira melhor de expressar isso. Mesmo assim, ela gritou com felicidade.

"Waaah! Obrigada!" Ela sorriu inocentemente.

Respondi enquanto terminava meu chá. Em algum momento ela havia terminado sua sobremesa, então era tempo de ir embora.

"Ah, espere um segundo. Me fale o seu número de celular. Vou te ligar."

"Hm? Ah..." Tirei meu celular do bolso. "Ok, é... uh, esqueci."

"Era o esperado. Ok, vou te passar o meu, então me ligue."

Disquei o número e liguei. Um toque surgiu de sua pequena mochila. David Bowie. Surpreendentemente, ela possuía um bom gosto.

"Ok, salvei seu número. Hey, Ikkun, sua celular não tem uma cordinha."

"Ah, sim. Não gosto dessas coisas femininas."

"Cordinhas são femininas?"

"Bem, não sou um especialista ou algo do tipo, mas definitivamente não são muito masculinas."

"Mmm, discordo." ela disse com consternação.

"Certo." eu disse, levantando do meu lugar com minha bandeja. "Te vejo amanhã, Mikoko-chan."

"Yep! Não me esqueça novamente!"

Ela acenou para mim, que eu respondi com um pequeno movimento enquanto eu saía do refeitório. Depois de devolver meus talheres e bandeja, fui até a livraria. Claro, sendo uma livraria universitária, a maioria dos produtos eram textos acadêmicos, e sua seção recreativa era limitada. No lado positivo, tudo possuía dez por cento, e por alguma razão (me pergunto por que) esta tinha uma enorme seleção de revistas, então ficava bem lotada.

Fui até a seção de novels e escolhi uma.

Espere. Huh? Me lembrei de algo.

"Espere um minuto. Mikoko-chan me chamou de Ikkun?"

Agora que eu penso sobre nosso encontro, o apelido que ela usava parecia se destacar. Não notei quando ela falou isso, mas acho que ninguém nunca me chamou com um apelido tão familiar no passado. Pensei por um momento, mas não consegui lembrar. Não tinha nenhuma memória específica dela me chamando assim antes, entretanto, também não lembrava dela não me chamando disso. Depois de tudo, quase não tinha alguma memória dela mesma, muito menos de uma coisa trivial como o nome que ela me chamava.

"Eh, tanto faz."

De qualquer maneira estava bom. Satisfeito com esse resultado, comecei a ler uma novel dentro da loja.

Yup.

Sem grande importância.

Dificilmente uma situação de vida ou morte.

Tudo estava bem com o mundo.

Mesmo se o Paraíso estivesse vazio.

3

O que é uma ferida fatal?

Decapitar alguém.

Sim, obviamente essa é uma.

Esmagar o coração de alguém.

De novo, óbvio.

Destruir o cérebro de alguém.

Naturalmente.

Parar sua respiração.

Esse é outro bom método. Bem finalizador, também.

Porém quando eu digo "ferida fatal", não me refiro a este tipo de coisa trivial.

Estou pensando em outra coisa. Uma ferida fatal é um impacto tão intenso, tão devastador, que você entra em um estado em que você não é mais humano, embora você ainda é um. Você não é mais capaz de viver sua vida, ainda que você ainda está vivendo. Significa ser quebrado em pedaços depois de ser vitima de um paradoxo relativo criado pela própria razão.

Isso é uma ferida fatal.

Em outras palavras, fracasso.

A chave aqui é o fato de que mesmo depois de uma falha profunda, nós continuamos.

O mundo é brutalmente tépido.

É tão gentil que é cruel. É um Paraíso demoníaco.

Falando de forma clara, você não morre por cometer um grande erro.

Ou devo dizer, você não consegue morrer.

Sim, você não morre.

Você apenas sofre.

Você simplesmente sofre em agonia.

E você continua. Para sempre, em qualquer lugar.

Sem sentido, você apenas continua.

A vida não é um jogo, não porque não existe um botão para reiniciar, mas porque não há um Fim de Jogo. Embora já "acabou" muito tempo atrás, o amanhã chega de qualquer forma. Mesmo quando anoitece, a manhã reaparece depois. Quando o inverno acaba, a primavera chega. A vida é maravilhosa.

É um paradoxo absoluto, mesmo depois de receber um golpe fatal, você não consegue morrer. É como perguntar o que uma pessoa vê quando ela olha para trás enquanto viaja na velocidade da luz. Uma questão impensável.

Embora o potencial de ser você foi há muito tempo interrompido, você continua. Você refaz tudo, de novo e de novo. Você refaz sua vida de novo e de novo.

Porém é como fazer um milhão de copias de baixa qualidade, e cada vez que você faz uma, seu "eu" fica um pouco inferior.

E eventualmente você começa a pensar...

E sou realmente eu mesmo, ou...

                                 ...eu me tornei alguma outra coisa há muito tempo? 

Eu deteriorei?

Assim como a figura central de um incidente não pode se tornar um inocente desinteressado de repente, você não pode se tornar seu próprio espectador.

E isso, meus amigos, é o que é verdadeiramente fatal.

"Em outras palavras, é como a mente sobre a matéria..." eu resmunguei. Enquanto ponderava essas coisas inúteis, eu estava provando o novo hambúrguer do McDonald's. O combo de 525 ienes.

O kimchi deve ter funcionado, porque meu paladar tinha voltado ao normal. Um hambúrguer do McDonald's voltou a ter um gosto bom. Afinal, como um Japonês, não tinha nenhuma maneira de continuar vivendo sem conseguir aproveitar um McDonald's.

O horário era 7:30 da tarde.

O lugar: Shijō Kawaramachi, Rua Shinkyogoku.

Depois que o quinto período terminou, decidi ver com meus olhos a polícia móvel que Mikoko-chan me falou, e meus pés me levaram tão longe em um esforço para matar tempo.

Próximo a bandeja com o hambúrguer tinha uma revista. Que eles chamam de "Revista Informativa Semanal." Eu comprei na livraria, e na capa dizia, "Contando a História: Jack o Estripador Revive na Cidade do Demônio!"

"Bem insípido."

O sentimento ridiculamente apocalíptico da revista foi, na verdade, a segunda razão pela minha compra. A primeira era porque possuía uma grande história sobre os incidentes do "predador" que Mikoko-chan estava me falando.

Coloquei duas batatas fritas em minha boca, um canudo e tomei um pouco de cola. Comecei a folhear a revista. A primeira página continha uma imagem vívida de um cadáver como plano de fundo, e com grandes, letras Gothic, estava escrito: "O Monstro Homicida Que Abalou Kyoto!"

Sinistro de fato.

"Então eles deixam mostrar fotos como estas..." Eu murmurei enquanto folheava as páginas. Já havia escaneado os detalhes do artigo, logo sabia pelo menos alguma coisa sobre os incidentes, se não tudo.

A mídia apelidou a sequência de crimes de "Assassinatos em série pelo predador de Kyoto." Não era o nome mais imaginável, porém um caso como este não precisasse de um. Ainda, a palavra predador dificilmente parecia ser uma descrição precisa do criminoso. Sempre pensei em predador como um stalker, alguém que observa pessoas na rua e causa danos a elas. Mas nesse caso o culpado estava atraindo as vítimas para áreas desertas, matando-as com um lâmina afiada, e finalmente desmenbrando os cadáveres. Talvez "serial killer" era uma descrição melhor que predador. E você poderia definitivamente fazer uma analogia com os assassinatos do Jack, o Estripador.

"Seis pessoas agora, huh? Nada mal." Eu murmurrei enquanto colocava a revista de volta na minha mochila.

Sim, seis pessoas. Assim como Mikoko-chan havia dito, seis pessoas em menos de duas semanas era o total de mortes. Era provavelmente a primeira vez que isso aconteceu. No terceiro assasinato, a força policial foi despachada para patrulhar por toda a região. Até a polícia de choque foi despachada, e mesmo assim os incidentes continuaram, como se o assassino estivesse rindo deles.

As vítimas não possuíam uma conexão aparente. Eram jovens e velhos, homens e mulheres. O assassino não perdoava ninguém. A polícia (e todos os outros, aliás) tinham considerado estes incidentes meramente uma série de atos de violência aleatória.

Portanto a sexta vítima provavelmente não seria a ultima. A matança continuaria. Enquanto este monstro permanecesse solto, ou decidir parar por vontade própria, teriam mais assassinatos. Talvez nessa noite. Talvez agora mesmo.

"É tudo um absurdo no final, huh?" Eu observei a Rua Shinkyogoku da entrada do McDonalds.

Era o mesmo cenário de sempre. Poucos turistas e estudantes em viagens de campo, mas ainda estava bem lotado, muitas crianças com o cabelo tingido estavam andando sem rumo. Suponho que você poderia chamar isso de sair e marcar território.

Ninguém, absolutamente ninguém caminhando nesta rua agora seriamente considerava que poderia ser a próxima vítima.

Claro, todos estavam sendo um pouco cautelosos. Alguns estavam visivelmente preocupados devido as unidades da polícia móvel espalhadas aqui e ali. "Que bagunça." podem estar pensando, mas é apenas isso. No máximo, eles iriam para casa um pouco mais cedo que o normal.

Fundo em seus corações, todos acreditavam que iriam para casa.

É assim que as coisas funcionam. São poucas pessoas que podem aceitar a dura realidade e a possibilidade que eles seriam os próximos a morrer.

É verdade que a possibilidade de ser a próxima vítima era baixa: "Aquelas vítimas devem ter sido muito azaradas." Um pensamento terrível, mas no que mais as pessoas poderiam pensar?

De qualquer maneira... talvez eu deveria ir em frente e me misturar com a multidão desprotegida? Com isso em mente, eu levantei do meu assento e senti meu celular vibrar em meu bolso direito. O número na tela não era familiar. Porém eu não queria apenas ignorar-lo. Eu fui em frente e atendi a ligação.

"Ciao! É a Mikoko-chan!"

Animada desde o começo. Era fácil imaginar ela fazendo um joinha do outro lado, mesmo que provavelmente ela não estava realmente fazendo isso. Mas mesmo sem saber com quem ela estava falando, ela era tão amigável. O que ela faria se fosse o número errado? Uma faísca se acendeu em minha curiosa mente.

"Eh? Hey, é a Mikoko-chan. O que está errado?"

Não respondi.

"Uhh... É o Ikkun, certo?"

De novo, eu estava mudo.

"Olaaa? É o Ikkun, certo?"

Persisti em não responder.

"Fiz besteira? Huh? Fiz besteira!"

Continuei com o tratamento silencioso.

"Gahhh! É como se preparar para a próxima sessão de calistenia na rádio - sabe, aquele programa de exercícios que é transmitido na rádio - e eles falam ‘Estamos sem tempo, então apenas faça a dança da galinha!’ Me desculpe, liguei pro número errado."

Nesse ponto, eu finalmente disse algo: "Não, esta certo. Tudo bem?"

"Uwa!" ela gritou surpresa quando eu respondi. "Huh? Quê?" ela gaguejou, confusa. Eventualmente, ela suspirou, logo percebi que ela havia se acalmado um pouco. Também descobri que era uma questão de poucos segundos até seu alívio se transformar em raiva.

"Pelo amor de deus! É um celular! Você tem que falar alguma coisa! Eu vou ficar desesperada se você não falar! Ikkun, seu idiota! Sua víbora! Seu... seu monstro!"

Não acho que fiz algo tão ruim.

"Desculpe, desculpe, estava apenas brincando."

Não queria ficar quieto por tanto tempo, mas não esperava uma resposta tão engraçada. Antes de perceber, perdi meu tempo para responder.

"Deus... Está tudo bem, eu acho. Já que é você."

Ela deixou um lamento escapar. Era difícil não sentir um pouco mal. "Umm," ela recomeçou, de volta ao normal. "Essa é uma chamada para falar de negócios! Falar sobre amanhã!"

"Sabe, não é necessário gritar. Está quieto aqui."

"Hm? Onde você está agora?" ela perguntou.

"Ah, uh, estou em casa. Em um internato."

"Oh. Ainda estou na escola. Falei com o professor Inokawa sobre algo, então acabei de sair da sala de pesquisa. Aquele lugar não é incrível?! Livros em todos os lugares!"

Inokawa-sensei dava as aulas de educação geral. Um professor assistente um pouco excêntrico, ele era popular o suficiente com seus alunos se você ignorar o fato dele ser extremamente estrito com pontualidade. (Se você não estivesse sentado antes do sinal tocar - mesmo se estivesse na sala e no meio do ato de sentar enquanto o sinal estivesse tocando - ele marcava uma falta).

"Umm, certo, sobre amanhã. Você estará em casa?"

"Sim, certo. Vamos nos encontrar em algum lugar?"

"Uh-uh. Se marcarmos um lugar, podemos acabar se desencontrando, certo? Isso não é bom, então eu vou te encontrar no seu internato. Eu comprei uma scooter e queria dar uma volta com ela. Então, vamos marcar às quatro horas. Posso ir a sua casa às quatro?"

"Sim, tudo bem, mas... você sabe onde o internato fica?"

"Huh? Oh, sem problemas." Ela parecia afobada. "Quero dizer, é porque a gente fez uma lista com nossos endereços quando as aulas começaram, então eu sei.

"Apenas o endereço é suficiente?"

"Eu conheço Kyoto bem, então está tudo bem. Você está no Senbon Nakadachiuri, certo?"

"Huh?" Eu perguntei. Havia algo suspeito em sua fala, porém se ela disse que ela sabia, pensei que não teria nenhum problema.

"Tudo bem por mim," Respondi.

"Okay. Está decidido, então. Hmm, eu gostaria de falar mais um pouco já que liguei para você, mas tenho que ir para a auto escola daqui. Eu marquei uma aula, e se eu não for agora estarei atrasada."

"Huh. Você está indo para a auto escola."

"Yep. E você? Tem uma carteira de motorista?"

"Tenho. Apenas para automáticos."

Se não fosse tão difícil de conseguir uma carteira, eu poderia dirigir qualquer coisa, mas isso era um segredo.

"Entendo," ela disse. "Eu quero um manual. Estou chegando naquela idade em que quero meu próprio par de rodas, sabe? Meu pai disse que me comprará um carro quando eu conseguir minha carteira. Yup. Te vejo amanhã. T-t-t-tchau!" Ela riu e desligou. Eu encarei meu celular um pouco antes de guarda-lo no meu bolso da calça.

Certo. Nós tinhamos planos para amanhã, não tinhamos? Eu não tinha completamente esquecido, mas estava quase. Desse jeito, talvez esqueça de novo amanhã. Talvez fosse melhor escrever "Planos com a Mikoko-chan amanhã" na palma da minha mão, como um estudante do fundamental.

Oh, mas se ela me buscar em minha casa, não faria diferença se eu lembrasse ou não. Eu ficaria em casa o dia todo. Coloquei meu estojo na mochila de novo.

Nessa vez eu realmente saí do McDonalds. Já era quase oito horas, e as lojas estavam começando a fechar. De repente eu lembrei de algo.

"Ah, certo. É um aniversário."

Nesse caso, eu deveria aproveitar a oportunidade e comprar um presente enquanto eu estava fora. Era apenas senso comum - embora eu nunca pensei em mim mesmo como um pessoa com bastante senso comum.

Logo, fui meio-forçado a ir comprar. Talvez eu não precisasse sair do meu trajeto para ser um cara bonzinho or algo assim. Enquanto pensava nisso, eu entrei em uma loja de souvenir perto.

Emoto Tomoe. Agora, que tipo de personagem ela era? Eu não tinha nenhuma memória dela. Quando eu ver ela, talvez lembre alguma coisa. Mas não importa o quanto eu pense sobre ela, não consigo lembrar ao menos uma coisa sobre ela. O que significa que ela não era uma pessoa excêntrica ou notável. Talvez ela era mais quieta que os outros. O tipo de pessoa que lê um livro antes da aula, ao invés de mexer no celular.

Espere... Mikoko-chan não disse que ela era uma garota chamativa que sempre usa coisas brilhantes? Huh. Eu não tinha ideia mesmo. Nem uma imagem vaga.

Também havia estas duas pessoas: Atemiya Muimi-chan e Usami Akiharu-kun, certo? Eu tentei lembrar deles, mas sem sucesso.

"Eh, já que são amigos da Mikoko-chan, acho que não são estranhos."

"Diga-me com quem andas e te direi quem és." Cervantes disse, mas com certeza você poderia mudar a ordem e ainda faria sentido. Não é algo para se preocupar.

Enquanto minha mente divagava, eu peguei uma caixa de lanches da prateleira. Eles eram cookies de canela yatsuhashi moldados em triângulos e recheados com pasta de feijão vermelho. Um lanche japonês convencional. Trinta pedaços, mil e duzentos ienes.

"Hm..."

Kyoto e yatsuhashi - uma confecção feita com farinha de arroz, canela, e açúcar - eram sinônimos. Se não havia yatsuhashi, não era Kyoto, ou seja, se há yatsuhashi, era Kyoto. Comparado à yatsuhashi, o Templo de Kiyomizu, o Festival de Fogo Daimonji e os Três Grandes festivais não importavam. Santuários e templos Budistas era irrelevantes. Se você não comeu yatsuhashi, você não conhecia 80% de Kyoto.

Okay, pensei.

Então estava decidido que Tomo-chan receberia comida de presente. Eu não queria sobrecarrega-la com algo não descartável, e descobri que seria a coisa perfeita para comer enquanto bebiam. Calma, coisas doces combinavam com álcool? Eu não bebia, logo não sabia. De qualquer maneira, não é como se fosse incomestível.

E então senti calafrios em minhas costas.

Parecia que nitrogênio liquido foi derramado em minha medula óssea. Como se meu corpo todo fosse congelado a zero absoluto e o calor do ar de fora iria me queimar. Apenas um nível básico de funções cerebrais restaram. Senti uma pressão intensa me esmagando. Se eu não conseguisse manter minha compostura, com certeza eu seria pulverizado.

Eu não olhei para trás. Apenas tentei me mover o mais calmamente possível, e confiei a caixa de yatsuhashi ao balconista da loja. O funcionário tinha um brinco marrom, um rabo de cavalo marrom, e um sorriso que não era muito profissional.

"Bem vindo." Ele embrulhou os doces para mim, e aceitei quando paguei a quantidade exata. "Por favor, volte sempre." Ele disse balançando a cabeça animadamente. Definitivamente esse era o tipo de serviço sincero que capturava o coração dos turistas, eu pensei que era um pouco irrelevante, enquanto eu saía da loja e ia em direção à Rua Shijô.

E então eu senti aquilo. Um olhar tão intenso que não poderia ser ignorado depois de ser percebido, um olhar tão feroz que era impossível de não ser percebido. Não, era mais que um olhar.

Era a intenção de matar.

Era um desejo assassino 100 porcento puro. Nada - nem uma em um milhão de emoções; sem ânimo, agressão, ou travessura - diluiram a pureza deste desejo. Meu corpo sofreu com um sentimento terrível. Este sentimento estava longe de ser desagradável ou instável.

Caminhei.

Aquele sentimento me seguiu.

Andei mais um pouco.

O sentimento ainda estava lá.

"Em outras palavras, estou sendo seguido." Eu murmurrei para mim mesmo.

Desde quando? Desde onde?

Não tinha ideia.

Era tão perceptível que nem precisei olhar para trás.

Era tão perceptível que nem era necessário sentir-lo.

Isso significava que quem estava fazendo isto com certeza notou que eu havia o percebido. O fato de que continuaram a me perseguir mesmo assim era a coisa mais óbvia de todas.

"Isto não é bom." Eu suspirei e tracei meu caminho entre a multidão. Era estranho. Eu realmente pensei que havia deixado todo o perigo para trás... naquela ilha do outro lado do mar. Ser rastreado até esse país, a essa cidade, não menos, parecia impensável, ainda mais ser morto. Eu já tinha empregado as habilidades da Kunagisa para confirmar isso.

Nesse caso...

Esse era um ato aleatório.

A primeira coisa que veio à mente era a história daquela revista na minha mochila.

O fatiador.

"Aw, não." Que destino cruel provocou isso? Se eu fosse falar como a Mikoko-chan, seria algo como, "É como formar outro Onyanko Club[8], mas todas são dançarinas reservas." Pensando de novo, não tenho ideia do que isso quer dizer. Acho que você não deveria tentar ser algo que não é. Claramente eu estava em pânico.

Mas mesmo supondo que a pessoa que estava mil pés atrás de mim agora era o famoso predador, ou apenas um assassino psicótico ordinário, ou até alguém que guardava rancor contra mim...

Alguma coisa estava errada. Apenas não fazia sentido. Era insondável e absurdo.

O que eu senti era desconforto. Sim, como o desconforto que você sente quando nota o reflexo do espelho te olhando de volta, tipo uma explicação de um livro didático totalmente errada. Confirmei que a linha vermelha que normalmente está na frente, de repente, estava atrás.

"Mais absurdos?" Com certeza era uma ilusão.

O que importava agora era que alguém estava me seguindo. Este tanto era certeiro. Isso e que, algum momento próximo, eu seria morto. Com esses dois fatos essencialmente definitivos em mente, eu não tinha tempo extra para ficar distraído com outras emoções. Por fim, minhas opções eram limitadas.

Dar, ou receber.

"Ahhh, isto está se tornando um problema terrível."

Fui da Rua Shinkyogoku até a Rua Shijô. Do outro lado de um aglomerado de táxis, havia uma longa fila de carros. A Rua Shijô era extremamente congestionada nesse horário, sendo mais rápido andar do que dirigir. Em uma cidade como Kyoto, que tinha tantos semáforos a ponto de não ser nem mais engraçado, uma bicicleta era o melhor jeito de andar por aí.

O número dois, a propósito, era a pé. Talvez o número três era uma prancha de bodyboard.

Eu fui para a escola de ônibus, então o número dois era minha única opção. Eu debati por um instante para qual direção ir antes de seguir para o leste.

Depois de uma pausa no sinal vermelho, eu cruzei a Rua Kawara-machi. Se eu continuasse reto nesta rua, chegaria no Santuário Yasaka. De lá, seguir ao sul me levaria ao Templo Kiyomizu. Era uma rota para turistas que visitariam o templo de Kyoto. Mas eu não era um turista, nem tinha intenção de ir tão longe até o Santuário Yasaka.

Eu estava nervoso. Senti aquele olhar e sua pressão se aproximando. E se ele me alcançasse em algum momento, a pressão irromperia em plena, simples violência.

"Ah... isto será arriscado." Já era Maio e eu estava suando frio. Quanto tempo se passou desde a última vez que eu me senti tão nervoso? Não senti nada assim desde quando eu saí daquela pequena e estranha ilha. Mas ao mesmo tempo, o que eu senti agora era de alguma forma distintamente diferente comparado ao que eu experimentei antes.

Eu estou nervoso, logo estou em paz.

Fiquei ciente de que, para o eu neste estado nervoso, falhar era algo totalmente improvável.

"Phew..."

Logo depois cheguei no Rio Kamo. Ao invés de cruzar a grande Ponte Shijô, desci as escadas e emergi na margem do rio. Quando o sol nascia, inúmeros casais de jovens começariam a preencher a margem do rio. Na minha opinião, essa margem, alinhada com os pares perfeitamente espaçados, era uma das três melhores atrações de Kyoto. Quando o luar brilhava, a margem se oferecia como um lugar pós-bebida para os bêbados. Depois de beber a noite toda, eles podiam ir lá para dormir. Havia todo tipo de bêbados, desde estudantes universitários até homens assalariados.

Havia algo em comum entre os bêbados e os amantes: Ambos eram incômodos que jogavam sua felicidade na cara dos outros. Mas não havia tempo para filosofar. Não importava o que eu pensava sobre os bêbados e os jovens amantes, apenas uma coisa importava agora. Era o breve momento do dia em que a margem do rio estava vazia. Os amantes já haviam ido para casa e os bêbados ainda estavam bebendo.

Em outras palavras, era a situação perfeita.

E estar debaixo de uma ponte a deixava ainda melhor, certo?

Entrei na sombra da ponte assim que eu desci para a margem. O som dos carros passando acima. A conversa das pessoas cruzando a ponte. Era um tumulto. Mas não era o suficiente para esconder os passos desse cara.

Confusão.

O som do atrito no assoalho.

Eu murmurrei alguma coisa e me virei.

Ele fez um barulho incoerente enquanto me encarava.

Meus sentimentos nesse ponto eram provavelmente pura e simples confusão. Ordinária, confusão diária e nada mais.

Havia um espelho em minha frente.

Ou assim eu pensei.

Sua altura era um pouco mais baixa que cinco pés, ele tinha membros longos e era esguio como um caule de uma flor. Ele vestia um shorts com estampa de tigre; botas rústicas antiderrapantes; uma parca vermelha, encapuzada e com mangas longas; e um colete tático preto. Suas mãos estavam cobertas com luvas, mas obviamente não eram para algo tão covarde como cobrir suas digitais, já que eram luvas sem dedos. Era apenas um chute, mas diria que elas serviam para um propósito muito mais sinistro - impedir sua faca de escorregar com o suor.

Seu cabelo grande estava amarrado atrás e bagunçado aos lados como se ele fosse um dançarino. Sua orelha direita tinha um piercing triplo, e duas alças que pareciam pertencer a um celular. Seus óculos de sol estilosos deixavam sua expressão ilegível, mas a tatuagem sinistra obviamente real no lado direito de seu rosto transmitia a excentricidade desta pessoa de uma forma clara.

Ele era diferente de mim em quase todas maneiras possíveis. Nossas similaridades terminavam com a idade e gênero.

E mesmo assim eu sentia que estava olhando para um espelho.

Logo, naturalmente, eu estava confuso.

E meu novo amigo parecia estar do mesmo jeito.

Ainda, ele fez o primeiro movimento. Ele inseriu sua mão direita em um bolso de sua roupa, e um instante depois ele estava brandindo uma faca pequena, de cinco centímetros. Ele não fez nenhum movimento desnecessário. Era como se ele havia superado os limites de meros humanos. A luz e o som pareciam distorcidos ao seu redor.

Mesmo supondo que eu estava observando tudo isto do ponto de vista de um espectador sem envolvimento, mesmo sabendo que isto era um assassinato, sua técnica era tão perfeita que eu só podia a descrever como arte.

Não tinha como escapar. Não tinha como aceitar.

Mas eu consegui desviar da faca puxando a parte superior do meu corpo para trás. Claro, normalmente issto seria impossível. Não diria que eu sou menos atlético que a média, mas também não sou nenhuma Mary Lou Retton. Eu não possuía o reflexo nem o corpo ágil necessário para ser um concorrente plausível para o título de lutador com facas mais rápido do mundo.

Mesmo assim, supondo que um caminhão à 160 quilômetros por hora está vindo em sua direção, mas você o percebe quando ele está a alguns quilômetros de distância, acho que todos podemos concordar que desviar seria uma tarefa simples.

Da mesma maneira, eu estava antecipando o ataque do meu agressor. Seu ataque era tão óbvio que era como se eu estivesse esperando ele pelos últimos cinco anos.

Eu segurei rapidamente minha mochila, e a girei, na esperança de acertar a cara dele. Mas com não mais que um simples movimento do pescoço, ele conseguiu desviar do meu ataque como se ele estivesse esperando por dez anos.

Porque eu havia me esticado para desviar de seu ataque, eu tombei para trás. Claro, eu não fiz nada tão tolo como tentar rolar para ficar de pé. Até mesmo um braço desperdiçado em tal manobra definitivamente criaria uma oportunidade perfeita para o assassino. Assim como eu temia, ele se recuperou de seu erro inicial e mirou na minha artéria carótida. Isto não é bom. Não havia maneira de desviar nesta posição. Acho que eu poderia teoricamente rolar e desviar deste primeiro ataque. Mas no próximo momento, ou o momento depois desse, independente do quão pateticamente eu me debatesse no chão, ele mergulharia aquela faca em minha espinha. Eu podia imaginar isto tão claramente que me senti como uma certa adivinha que conheci uma vez.

Neste caso, desviar estava fora de questão. A chave era simplesmente ataca-lo. Eu balancei meu cotovelo em direção a sua faca.

Meu oponente torceu seu punho, alterando a direção do seu ataque. Consequentemente, o momentum restante do meu cotovelo não acertou nada. Isto deixou minha frente, incluindo todos meus órgãos, principalmente o coração e os pulmões, completamente expostos para o inimigo.

Atrás do óculos de sol, seus olhos pareciam sorrir fracamente.

Com outra mudança na trajetória da faca, ele mirou diretamente em meu coração.

Um momento de pausa.

E então sua faca tática desceu com o dobro da velocidade. Sua vontade de destruir uma vida humana era tão forte que fez seu corpo mover numa velocidade indetectável ao olho humano.

Ele não me deu tempo suficiente nem para suspirar. Está certo: Não consegui nem suspirar.

Mas eu sabia que isso aconteceria antes mesmo de nascer.

____________________________________________!

____________________________________________!

A faca cortou uma simples camada da minha roupa e parou. Meu dedo indicador esquerdo e dedo do meio haviam o parado - por levantar o óculos de sol do meu assaltante.

Um empate.

Ele tinha meu coração e eu tinha seus olhos. Se você colocar os dois em uma balança, seus pesos obviamente diferiam, mas isto não era algo para ser pesado em uma balança. Para meu oponente, rasgar minha carne e osso para demolir meu coração era mais fácil que tirar doce de uma criança. Mas deixaria o tempo exato para eu pulverizar seus globos oculares.

O oposto também era verdade.

Eu podia sacrificar meu próprio coração para destruir seus olhos, e ele podia seus olhos para obliterar meu coração. Logo, um empate.

Ficamos desta maneira por pelo menos cinco horas, ou foram cinco segundos, e então: "Isto é uma obra prima." Ele disse, jogando sua faca fora.

"Um absurdo é o que isto é." Eu retrai meus dedos.

Ele se afastou de mim, e eu levantei lentamente, removendo a sujeira da minha roupa e corrigindo minha postura.

Nossa luta havia sido uma farsa - mas foi tão harmoniosa, que pareceu predestinado. Senti uma incrível vontade de desmaiar.


"Meu nome é Zerozaki." Meu oponente disse enquanto ajeitava seu óculos torto. "Zerozaki Hitoshiki. Então quem é você, Senhor Doppelgänger?"

Essa pergunta deixou um sabor ruim na minha boca. Era como me ver perguntando alguém qual era meu nome.

E isso - isso era o primeiro encontro entre o espectador passivo e o monstro homicida.

Estranhamente, era Sexta-feira treze.

Referências[edit]

  1. Donburi, literalmente tigela, é um prato japonês de arroz na tigela, contendo peixe, carne, vegetais ou outros ingredientes parecidos juntos, servidos em cima do arroz.
  2. Kimchi são condimentos típicos da culinária da Coreia.
  3. Um estilo de cabelo.
  4. A Golden Week (Semana Dourada) é a junção de quatro feriados nacionais no final de Abril / início de Maio.
  5. O Festival de Gion acontece anualmente em Kyoto e é um dos mais famosos festivais do Japão.
  6. Gyudon (tigela com carne bovina), é um prato japonês que consiste em uma tigela de arroz coberta com carne bovina e cebola.
  7. Rede de fast-food especializada em gyudon.
  8. Onyanko Club era um grande grupo pop idol japonês feminino em 1980.